A EMENDA E O SONETO

Um jovem escritor pediu a Bocage que examinasse um soneto de sua autoria, e marcasse com cruzes os erros. O escritor leu o trabalho, mas não colocou as cruzes. Com as correções acabaria ficando pior que o próprio soneto. Usa-se a expressão “a emenda saiu pior que o soneto” quando se quer consertar um ato falho de uma forma infeliz.

A Valdirene, que não gostava do nome e preferia ser chamada de Irene, cresceu linda que parecia não poder ser mais. Linda, simpática, comunicativa, generosa, inteligente e elegante. Ficava elegante de fio dental. Mulher de se sonhar em viver perto dela, não sendo possível como namorado, marido, sócio, que fosse como colega de trabalho.

Foi por obra de algumas de suas virtudes que com pouco mais de vinte anos, formada na melhor das universidades da cidade, classificou em posição de destaque no primeiro concurso público que fez e no concorrido cargo de auditora aportou na repartição onde, em polvorosa, comentavam:

- Uma deusa!

- Uma máquina!

A chefia estabeleceu como prioridade descobrir como estavam as relações de trabalho entre empregadores e trabalhadores em motéis, registro de empregados, horas extras e higiene. Trabalhadores permanentes, nada de certas moças e rapazes que ganham por hora. Era preciso aproximar e treinar os jovens, nada muito complicado ...

A Valdirene era suficientemente jovem, desenvolta e, principalmente, não se achava. Estacionada no primeiro amor desde os dezessete, um desperdício, diziam muitos, não via na empreitada certas maldades da vida. Topou sem questionar.

Na primeira vez, realizou a atividade com uma colega e um colega. Chegaram cedo ao motel e saíram os três, no meio da manhã, a pé, que em início de carreira o grupo ainda caminhava para trabalhar, por sorte, sem encontrar conhecido. Tempos depois dizia que foi a única vez que saiu de um motel num grupo de três, andando.

Outra vez, havia um carro da repartição disponível. Chegou e saiu do motel com o motorista e um colega num carro oficial. Ninguém registrou, ainda bem.

Outro dia, mais experiente, resolveu ir sozinha.

Eram pouco mais de oito da manhã quando saiu do apartamento onde vivia. Parou um táxi, subiu e transmitiu ao motorista seu intento:

- Ali, na rua tal, defronte ao lugar tal, no motel.

O taxista, que havia se encantado com a forma como o dedinho da Valdirene havia solicitado seus serviços, deu um sorrisinho safado e constrangedor. A Valdirene quis explicar, intimidada, e disse:

- Eu vou trabalhar ...