Com um paraibano em Brasília

Que tipo de sujeito é esse que num espaço de 30 minutos consegue filar todos os cigarros da carteira de cigarro de dois brasilienses e ainda assim se despedir deixando nesses mesmos brasilienses a vaga impressão de que já são amigos de inesquecíveis boemias?

O fato de ser paraibano explicaria o fenômeno?

Ah, imagino-o descendo do aeroporto, lançando seu primeiro olhar sobre Brasília: que impressão lhe causara a arquitetura de Niemeyer? E as mulheres dessa cidade, que dizem frias, achaste alguma para aquecê-lo, salvá-lo do aniquilamento, da absurda solidão que acomete o turista? Não sei... Sei que acompanhava uma, sentava-se com uma moça a poucos metros de nós, dois brasilienses que estávamos por lá, por acaso, bebendo humildemente nossa caipirinha.

Aproximou-se e perguntou se podíamos lhe ceder um cigarro, e como nossa religião não permitisse a concessão de apenas "um", cedemos "dois". Depois o paraibano instalou seu cotovelo em nosso balcão, e perguntou, com vago interesse, se conhecíamos algum lugar bacana de Brasília, e que ele pudesse visitar. Recomendamos que, sem dúvida, esse lugar deveria ser o aeroporto... Afinal de contas, o aeroporto oferece a oportunidade, que nenhum outro lugar oferece, de dar o fora daqui o mais rápido possível. Os ônibus são muito lentos, já o avião não, esse cumpre esse papel com maior agilidade... É uma pena que sejamos tão duros, e não possamos arcar com as passagens. Sorriu e pediu que deixássemos de coisa.

Deixamos de coisa e eu disse, agora sério, que o quarto da Taeko era o melhor ponto turístico de Brasília. Ele se espantou, sorriu, fez-se de incrédulo. Cogitou a hipótese de contrabando: “Isso deve ser japonesinha mande in China... No mínimo!”. Diante de seu ceticismo me vi forçado a acrescentar que eram palavras da própria Taeko. Ora, se a Taeko falou tá falado, sem discussões, oras! Quem ainda ousa duvidar de suas palavras?

Deliciou-se imaginando como seriam os gemidos de uma japonesinha. Sim, Taeko era uma japonesinha... Uma boa japonesinha...

Cosmopolita, homem viajado, contou-nos os gemidos de mulheres em outros idiomas. E ficamos todos imaginando como seriam esses gemidos. Asseverou, ainda, que seu interesse era o interesse de um pesquisador. Tudo a serviço da língua. Contou-nos, por fim, sobre o estranho caso de uma suíça que gemia em latim, esperanto, mandarim, alemão, sânscrito, libras, tudo, menos em português...

Gritava ele, desesperado no coito: Speak English? Speak English?

Mas, ô diaba de suíça cruel, só lhe piorava a situação, gemendo alto, evocando o santo nome de Deus num confuso alemão: Óh, mein Gott! Óh, mein Gott! Óh, mein Gott!!!”.

Diante dessa tragédia, cismamos em torno da desvalorização da língua portuguesa. "Ah, Se Machado escrevesse no idioma de Shakespeare seria tão reverenciado no mundo quanto o próprio!". "É verdade. É verdade". Concordamos - unanimes.

Lembro ainda que contou-nos alguns causos e anedotas envolvendo Vinicius de Moraes e Antônio Carlos Jobim. Mas, entre tantos causos e anedotas contados, o que ficou realmente marcado na cabeça desse brasiliense que escreve essa crônica é, sem dúvida, a incrível anedota do paraibano que comeu uma suíça poliglota que sabia gemer em todas as línguas do mundo, todas, menos em português...

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Alex Canuto de Melo
Enviado por Alex Canuto de Melo em 07/07/2009
Reeditado em 11/07/2009
Código do texto: T1686615
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