Contador de histórias

Contador de histórias

Sou um antigo contador de histórias; tinha um repertório inesgotável...Histórias para todos os gostos; perguntava aos meus filhos o tipo de histórias que queriam; vassalos reis ou princesas; também, personagens cruéis e os mais horrendos bichos desfilavam, revezando-se tantas vezes quantas necessárias. Fiz muitas adaptações de clássicos, mudando-lhes o enredo, como por exemplo, Chapeuzinho Vermelho acabando com o lobo a golpes de guarda-chuva; Branca de Neve fazendo a madrasta estrebuchar na ponta de um facão com fio a laser etc. Deixei de contar histórias porque meus filhos cresceram e eu cresci; digo-o assim, pois, em criança contava-as também para os adultos. Minha avó materna as apreciava muito, não se cansando de ouvi-las; contava-me em troca, outras de arrepiar, às quais eu retribuía com lendas de almas penadas, velas acesas que se transformavam em canelas de defunto, para desespero de costureiras, que abusavam do trabalho, indo além da meia noite na azáfama. O que pretendo deixar escrito não é matéria de memória, com perdão do Heitor Cony, pois, para tanto faltariam as mentiras, ingredientes básicos para transformar memórias em ficção e vice-versa; no caso, ficção disfarçada muitas vezes sem happy end como no caso daquele memorialista. São histórias e casos, ou se preferirem, conversas de noites frias com muitos lobisomens rondando e mulas-sem-cabeça. Dizem que as mulas-sem-cabeça correm arrastando os cascos e fazendo fogo no chão, mesmo no barro, pois, o chão passa a ficar encantado. Não sendo memórias, quem tiver interesse poderá lê-las com toda liberdade, fazendo de conta que eu próprio as esteja narrando, assumindo, todavia o prejuízo de não ter as entonações que costumo dar às frases, num efeito levemente teatral. Pelo que já narrei, não posso entender como não cresci com medo de assombração! Todos os adultos que olharam minha infância juravam de mãos postas, melhor diria de pés juntos, que havia almas do outro mundo perturbando o sono das crianças indefesas e adultos desavisados. Todos da família já tinham encontrado alguém já falecido e contavam casos de estranhas aparições precedendo desmaios, acidentes vasculares cerebrais, crises epilépticas, infartos do miocárdio e outras mazelas; assombração deixava de ser susto pra ser etiologia! Segundo informações de minha tia, meu avô materno, antes do stroke, fora visitado por horripilante fantasma...Todos garantiam ser verdade! Seria?

Abrantes Junior
Enviado por Abrantes Junior em 14/07/2009
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