Saudades do Gordon

A mutabilidade das coisas geralmente aflige os homens. Não é regra absoluta, ainda bem. Solidarizo-me com aqueles que conseguem ver na mudança algo auspicioso, mas, confesso, tenho cá minha alma refratária ao que é novo. Em geral, devo admitir, não há muito a ser feito, principalmente quando se vive numa cidade que muda na velocidade do mais perene pensamento.
 
Falo especificamente do Gordon. O que fizeram com o Gordon foi covardia. A relação que mantinha com aqueles sanduíches e com o canguru que servia de marca registrada era quase familiar. Goleiro era o nome do lanche que invariavelmente fazia quando entrava no salão alaranjado e repleto de mesas de ferro grudadas ao chão. Era a minha lanchonete. O goleiro era de frango. Talvez minha primeira incursão irônica, ainda que despercebida no meio de refrigerantes e batatas fritas.
 
Sinceramente? Não quero saber se o covarde foi o poder público, a livre concorrência, a falta de boas práticas administrativas dos proprietários, o advento em terra carioca dos ‘fast foods’ americanos. Tiraram um suculento pedaço de mim quando cruzei a esquina e vi tapumes de madeira escondendo o simpático canguru sorridente. Abririam uma loja de decoração alguns dias depois.
 
Passaram-se os anos e os sanduíches. Descobri alguns bons locais de comer. No Rio, em Niterói, no país inteiro. A maioria, em verdade, bem melhor do que o goleiro engordurado que fazia os guardanapos ficarem transparentes. E daí? Pergunto eu. E daí, perguntam vocês.
 
E daí que o tempo passa e as coisas mudam. Simples assim.