Uma Crônica de Guiné-Bissau

De acordo com o site Notícias Lusófonas:

"Os guineenses ficam hoje a saber quem é o futuro Presidente da República da Guiné-Bissau com o anúncio dos resultados provisórios pela Comissão Nacional de Eleições do país, que serão feitos numa unidade hoteleira de Bissau."

Guiné-Bissau?

Bissau?

Onde fica Guiné? Na África?

Que língua eles falam?

É mesmo português?

Crioulo?

Eles conhecem o Lula por lá?

Choraram por Michael Jackson?

Uma Crônica de Guiné-Bissau

Por Frank Oliveira

Voei por Guiné-Bissau! Fui recebido por Cabral, não o navegador, mas o poeta que recitou:

« Ah meu grito de revolta que percorreu o mundo

que não transpôs o mundo

o Mundo que sou eu !

Ah ! meu grito de revolta que feneceu lá longe

Muito longe

Na minha garganta !

Na garganta mundo de todos os Homens »

O mundo somos nós, na nossa garganta está o grito de toda a gente, até daqueles que não conhecemos, pois vivem distante dos olhos; ausentes do campo de visão de nosso coração.

Daí encontrei outro poeta chamado Agnelo Regalla, que perguntou-me:

- O que trazes tu do Brazil?

- Meu espiríto, poeta - respondi, e ele me respondeu:

- Mas o que veio buscar, não há nada aqui pra ti, estrangeiro. Provavelmente deseja nos ofertar a tua música ou a tuas letras.

" Fui levado

a conhecer a nona sinfonia

Beethoven e Mozart

na música

Dante, Petrarca e Bocácio

na literatura

… Mas de ti mãe África ?

Que conheço eu de ti ?

a não ser o que me impingiram

o tribalismo, o subdesenvolvimento

e a fome e a miséria como complementos…"

- Vim buscar as tuas palavras, poeta - respondi e continuei voando, até que ouvi uma poeta fazendo poesia em português e em crioulo:

"Em que língua escrever

Na kal lingu ke n na skribi

As declarações de amor?

Ña diklarasons di amor?

Em que língua cantar

Na kal ingu ke n na kanta

As histórias que ouvi contar?

Storias ke n contado?

Falarei em crioulo?

Pa n kontal na kriol?

Falarei em crioulo! "

Seu nome era Odete Semedo e por mim, ficaria ouvindo seu canto por toda a noite, mas precisava voar e fui voando pelas terras de Guiné-Bissau, pelas terras altas do nordeste, pelo litoral, pelos mangais do arquipélago dos Bijagós, tentando pegar cajus por todo o sul.

E enquanto voava sob as margens do rio Gêba, desci e troquei umas prosas com Domingas Sami, Abdulai Silá, Carlos Lopes, Filinto Barros e Carlos Edmilson Vieira e recolhi contos, lendas e costumes populares. Eles me contaram sobre as suas letras que são a própria recordação de brincadeiras da juventude e as vicissitudes sociais e políticas da sociedade guineense.

Por último, agradeci a todos e voltei para o Atlântico. Precisava voltar pra casa, mas antes de deixar a amada África, agradeci a Filomena Embaló que comigo estava por todo o vôo pelas letras guineenses.