Sobre a Noite (e o Luar)
Algumas vezes as noites carregam um certo drama próprio, enlaçado pela lua que mingua e por amores despedaçados jogados na rua.
Outras vezes as noites carregam em si demônios tão cruéis que os mais santos seguidores do Credo tremeriam ante a presença aterradora destas criaturas.
A noite é o palco das loucuras. O palco das bravuras. O palco de bruxarias e feitiçarias que arrancam sonhos e almas e despejam desespero e horror.
A noite é a inspiração de poetas assassinos, de bardos macabros e artistas que encantam por seu talento e assombram por suas histórias.
Nas vastidões da noite impérios são erguidos e reinados de sombras assolam as cidades e os campos, os credos e exércitos.
O mais corajoso dos homens sente a presença da noite como uma navalha cega que, inerte na gaveta, aguarda o momento certo de cortar e fazer a dor e o medo corroerem mais que qualquer outra coisa neste mundo.
O mais sábio dos homens sabe que quando o manto cai olhos escarlates abrem-se no fundo dos becos, nas sombras das árvores e no silêncio pertubador das caminhadas noturnas. Cada passo ecoa no ritmo das batidas de um coração assustado.
O mais belo dos homens teme a noite como um reflexo imperfeito dos demônios que rondam seus pesadelos. Cobrando dívidas feitas a ferro e sangue nas perdições dos desejos satisfeitos sordidamente.
Mundos e reinos de dimensões incontáveis convergindo num resto de tempo que avança pelos ermos da mortalidade, pelos labirintos da fé e pelas praias tempestuosas da loucura e da arte.
Em bravatas insanas alguns desafiam a noite e são consumidos por ela, mastigados com ânsia e vômito, com seus mais explosivos momentos queimando lentamente, enquanto o tempo se esvai e arranca vida de seus entes amados.
A noite é o palco das loucuras. O palco das bravuras. O palco da fúria, das Legiões dos Úrias, das mais devassas luxúrias.
A noite esconde o que tentamos esconder: o lado frio do calor que arde em nosso peito.