Pé da Letra

Todo tatuzinho de jardim rola entre grãos de areia, quando descobre o perigo que é o mundo. Quando se abre dá com os pés em tudo. Há pés que são patas, alguns calçados em ferraduras, protegidos do duro bater em chão.

Interessantes mesmo são os pés de couve e de alface, vem na bacia todo verde, molhadinho de orvalho da banca do seu Mário. Toda quinta e todo sábado.

Tenho costumes de pés de embrulho, não que sejam presentes para mais alguém além de mim, mas estão sempre embrulhados em sandálias, chinelo, sapatos e pantufas. Algumas horas com laço e tudo.

Pés são coisas engraçadas, tem gente que come os de porco. Pra tudo há gosto. Gosto dos meus pés se esfregando em noite fria pra aquecer. São dois companheiros silenciosos, dividindo o peso junto.

Pedicures tem mal habito de ferir os pés. Tão indefesos que são. Todas elas deveriam ir ao workshop de tratamento aos pés cansados, ministrado pela mulher que ungiu os pés do Senhor. Derramando sobre eles um vaso de bálsamo, como citam as escrituras. A única mulher que ungiu ao Ungido. Jesus lavou os pés sujos dos discípulos, porque a sujeira vem da terra. Entra o mal pelos pés, diziam os antigos indígenas.

Pés são bases, então a letra levada ao pé é base de escrita, hieróglifo rústico de pensamento não lapidado. Sempre mal interpretado. Nem toda a palavra é aquilo que o dicionário diz segundo Fernando Anitelli e sua turma. Palavra que não é pé, é corpo e cabeça então pode se mover viva.

Alias
Enviado por Alias em 19/08/2009
Código do texto: T1763092
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