VIOLÊNCIA

VIOLÊNCIA

Houve um assassinato. Mais um entre tantos. Morte fria e premeditada; invejável na perfídia de sua execução; execução que foi calculada passo a passo, instante a instante, nos seus mínimos detalhes.

Um tremor percorre-me o corpo ao constatar que um ser humano pode ser tão frio – matar pelo simples prazer desse esporte.

O assassino? Sim, o assassino evadiu-se. Transpôs a orla da mata e por ela adentrou. Evadiu-se do local do crime não por medo das conseqüências do seu ato. Evadiu-se, simplesmente, porque seu prazer já fora satisfeito, e a presa, de fácil e pequenina, não lhe interessa mais, não lhe rende mais glórias, nem lhe dá lucros.

E eu, que a tudo assisti, incréu e estático, vi-me pregado ao solo como uma estátua de pedra. Sequer um grito de alerta ou de revolta liberou minha garganta intumescida Lívido e pesaroso presenciei à distância a queda do corpo no meio do matagal. Partículas de sua alma, de sua vida, do seu adeus e da sua saudade esvoaçam ainda ao sabor do vente cálido da tarde triste e moribunda. E essa chuva de plumas paira titubeante no ar sombrio da floresta até quedar-se no chão como pétalas desfalecidas.

Cai mais um artista – o artífice da liberdade. Um poeta dos sons alegres do canto sem versos. Um músico sem instrumento. O cantor que despolui a poluição sonora com seu canto jovial.

Morre o “simples” que infiltra esperança nos corações aprisionados pela descrença. O peregrino perseguido que adoça o amargor do cárcere. O letrista, cujos versos escritos na natureza, têm o poder de despertar amor e honestidade. O emissário da paz.

Morre, varado por uma bala certeira, mais um ser inocente e inofensivo, nas mãos de um vândalo malvado.

Cai com um gemido de protesto contra a agressão à fauna; com um gemido de protesto contra a extinção de sua espécie; contra a derrocada final do equilíbrio ecológico.

More mais um pássaro.

Afonso Martini
Enviado por Afonso Martini em 23/08/2009
Reeditado em 07/04/2012
Código do texto: T1769984
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