Vida Moderna

O homem continua a viver entre o animal e a selva. As metáforas com que ele próprio se confunde, acidificaram tanto que ele continua a valorar bem mais as ilusões do que mesmo as nossas esperanças. As metrópoles se impõem sobre os indivíduos e, desfolegada, a civilização sobrevive esbaforida, entre as dificuldades e os pavores modernos, como se fosse constituída por bichos açodados entre cruzes e espadas. Os problemas surgem e se avolumam de forma estranha, tão estranha que mais parecem insolúveis. Eles se autoalimentam como se estivéssemos vivendo pela última vez e nada mais pudesse ser resolvido ou mudado.

Sabemos que, nos dias atuais, muitas famílias tentam mudar-se para plagas mais mansas e silentes, diferentes das grandes cidades, onde, cada vez mais, viver bem passa a ser um ofício dificílimo, quase impossível. Elas têm procurado os lugares mais distantes onde ainda se pode encontrar uma natureza pouco devastada, guardiã de um ar puro ou quase isso, com um viver mais oportuno. As metrópoles tornaram-se os focos dos burburinhos insuportáveis e da insegurança. Nelas não se vive, apenas se vegeta. Até a lua se esconde por trás da fumaça parda da poluição que permanece no céu como se teimasse em afirmar que estamos desconstruindo a vida neste planeta.

Tenho ouvido muito os moradores desses rincões modernos falarem de uma vontade lúcida de mudança. Trabalha-se a vida toda com a intenção de conseguir algum dinheiro, comprar uma nova morada nos campos das cidades pequenas e pronto. Só que quando isso acontece, esses pretendentes já têm encontrado a doença e não mais acham o tempo merecido para aproveitar esses dias últimos em suas vidas. É uma pena!

Nem todas as pessoas que regam na alma o sonho de morar em um lugar sossegado, conseguem. Muitos desejam afastar-se dessa febre maculada da vida moderna. Mas, nem todos os que desejam essa vida mansa e pacífica conseguem. Os que ficam sonham e, os que sonham, dificilmente ficam. A luta por uma vida melhor tornou-se um exercício desafiador para o homem moderno, vítima da poluição e da insegurança.

Nunca dantes, viver bem foi tão almejado e carecido. Os hábitos modernos têm sido construídos por todos nós, como se eles fossem evitar nossos tropeços existencialistas bem como o fim de tudo. Quanto mais a ciência evolui, mais doenças surgem, cada vez mais desafiadoras das terapêuticas. E nós vamos fomentando a destruição e aprendendo a reconstrução, só que esta de forma mais lenta. O modelo de vida que estamos defendendo nas últimas décadas é egoísta demais para continuarmos a defendê-lo. Precisamos socializar os nossos problemas e as nossas soluções. Nada sobreviverá no desaconchego de qualquer isolacionismo.

Não merecemos o que nós mesmos estamos construindo/destruindo. Urge um basta em tudo isso. Estamos bem mais próximos da morte do que mesmo da sobrevivência. Já passa da hora de agirmos com mais firmeza. Destruímos tanto o planeta que, se não corrermos para refazer os maiores estragos, nada sobrará de nossa história. Reaprender com as velhas lições de vida é meritório.

O modelo de vida que construímos nas últimas décadas é insustentável. Disso sabemos todos nós, e, apesar de termos consciência disso, muito pouco estamos fazendo. Poluímos até nossas próprias consciências. Ao que parece, o homem não tomou a devida dimensão do problema que ele tem causado ao meio ambiente e por isso tem feito tão pouco. O planeta agoniza. Não sente uma dor amena, mas está convulso e fechando os olhos vitimado pela agonia da morte. Se continuarmos a destruí-lo, chegará um instante em que, mesmo que quisermos, nada mais poderemos fazer de bom e útil. Haverá uma hora em que a destruição retirará de nossas mãos qualquer solução real e aí ficaremos todos nós apenas a lamentar pelo leito derramado.. E para que isso não venha a acontecer, paremos de destruir a Terra e passemos a refazer os estragos que tão egoisticamente cometemos ao longo destas últimas décadas. Nossos filhos e nossos netos jamais poderão ser privados de viverem na natureza viva de ontem, quando começamos a destruí-la impensadamente. Vida para a vida. Renovar nosso modelo arcaico para um novo, onde possamos presentear um fôlego limpo às gerações futuras, é o que devemos fazer já.