RUÍDOS DE JORNAS

Na qualidade de leitor assíduo de meu grande amigo,poeta e escritor,Dante Marcucci tenho observado nêstes últimos dias um direcionamento dos temas de suas crônicas para as coisas típicas do Sul,mais especificamente do Rio Grande do Sul,sua terra natal.

Ótimo!...Dessa forma ficamos conhecendo tradições e costumes que se nos apresentam como novidades.Senão,vejamos:os KERB,por exemplo,totalmente novo para mim acostumado que fui aos bailes do Sul do Paraná num harmonioso entrosamento de caboclos (meu caso) e a grande maioria constituída de poloneses e ucranianos.Vale afirmar aqui ter sido num desses bailes "apolacados" em que fisguei ou fui fisgado por uma encantadora polaca de olhos de esmeralda que atura minha ranzinziçe há mais de 33 anos.

Aí,num comparativo eu diria que KERB e COLOMÊICAS,prestavam-se à mesma finalidade;ou seja,promover o encantamento e a sedução por "Fridas" ou "Nusxchkas".

Em outra de suas crônicas o inspirado poeta relata com maestria sobre os MEDAS;o que para nós paranaenses denomina-se PITOS.A finalidade é a mesma;o que costuma acontecer no interior de suas fendas é discutível...Aqui vou acompanhar o que diz a Cassandra,personagem do Toma lá...Dá cá..."Prefiro não comentar".É comum ainda nos dias de hoje deparar-se com cones de feno (Pitos) nas pequenas propriedades rurais,dando complemento ao bucolismo que estas paisagens ensejam.

Viajando lá pelas bandas do saudosismo,há que se resgatar a alegria gerada quando da confecção dos pitos.O cheiro do feno não muito sêco,carregado aos maços...Alguém no topo da escada amarrando os primeiros feixes e embaixo a farra da gurizada rolando na montanha de capim,tendo como recompensa (ou vingança?) da natureza uma coçeira que dava dó.Mas a festa já tinha acontecido,e era o que realmente importava.

Diante dos relatos perfeitos do amigo escritor,veio-me à lembrança o ruído das "Jornas".Sim,"Jornas"...Não consta do Aurélio;o Google define a palavra como sendo jornal instantâneo,ordenado,salário...No entanto,a "Jorna" de que lhes vou falar me parece ser alguma palavra da lingua polonesa ou ucraniana,possivelmente...Procurei por um polaco ou Naschelhude (ucraniano gente-boa) que pudesse me esclarecer.Como não poderia ser diferente saí topando em ambos,porém,jóvens que não saberiam me informar,certamente.Enfim,jorna era o nome que se dava a um triturador manual de milho,confeccionado a partir de um tronco,geralmente de imbuia,com adaptação de um latão perfurado como um ralador,girando dentro de uma gamela.Movia-se a manivela e o milho triturado ia caindo num recepiente adaptado abaixo do tripé de sustentação da engenhoca.O ruído provocado pela obsoleta máquina (?) era algo de grotesco que funcionava como marca registrada de dias chuvosos com a piazada reunida nos celeiros repletos de espigas e entre uma e outra manivelada os espaços de tempo eram usados para as guerrinhas de sabugos,caçadas às ninhadas de ratos,e ,por que não,no escurinho do celeiro,ainda que sem drops de aniz,a descoberta da sexualidade,coisa perfeitamente nomal a uma geração de faixa etária oscilando de l0 à l4 anos.

As brincadeiras com os "goíches".Sim...Goíches!...Nome que por aqui se dá ao talo de palmeira depois de despido de suas folhas,usadas que são no complemento da ração de animais.Eram objetos de uma ingênua (estranha) brincadeira que exigia muita destresa e rapidez nos saltos,sob pena de levar uma "goíchada" nas canelas,o que doía muito.

Taí,meu caro poeta!...Você me apresentou os seus Kerb e Medas,eu lhe faço conhecedor (se é que não os conheçe) das Jornas e os guíches...Independente de nomes e funções a que se propunham,o importante é saber que fizeram parte de nossas vidas...

E aqui eu tomo a liberdade de dizer "nossas" avaliando a emoção de tuas palavras como gêmea daquela que me ocorre quando leio seus escritos.Por isso,envolvido nêste gêmeo sentimento,não tenho dúvida de que ,igualmente,fomos pés descalços que amassaram lôdo,banharam-se em açudes,em sangas,cataram cogumelos depois das chuvas...Vislumbraram manhãs se abrindo e tardes lacradas aos odores de marcelas,sinamomos e estrume.Agacharam-se na grama protegendo-se das esporas de quero-queros,levaram algumas quedas de inexpressivos pangarés e,aí cansados,adormeceram debaixo de um céu,exclusivo,onde as estrelas costumavam confidenciar sonhos à cada piscadela.Acordaram-se hoje.Saudosistas,sim...Mas com a leveza de um voar de curucacas delimitando o infinito,acalentando n´alma visões de um tempo de ternura imensa,que foi semente e germina agora em nossos melhores dias.

Esta crônica é uma singela homenagem ao querido amigo DANTE MARCUCCI,o poeta das madrugadas.