NEGÃO MECÂNICO

Arnaldo Patrão, um amigo meu, sempre dizia que o sujeito tem que ser amigo de um bom gerente de banco (isso, quando gerente de banco tinha poder de decisão, porque hoje, na era da informática, quem manda mesmo é o “sistema”), de um bom barbeiro (eu sou amigo do Ivair, no salão do “Esterlei”) e de um bom mecânico de automóveis.

Quanto ao mecânico, sou amigo do Gerson, mais conhecido como “Negão”. Com sua oficina ali no Ipiranga, na Rua Linhares quase esquina com Avenida Renascença, ele é pau pra toda obra:- se o carro enguiça e não vai até ele, ele vai onde está o carro ... e resolve o problema!

Forte como um touro, o “Negão” é o sósia perfeito daquele ator americano que interpreta o boxeur rival do Stalloni em “Roque Balboa”, Carl Weathers. Cara dum, focinho do outro, o compadre Gerson alia as suas qualidades de bom mecânico às de um mestre cuca da pesada, sendo emérito ao lidar com carnes e peixes, fazendo ainda uns caldos de dar água na boca (de mocotó, sua especialidade). Como ele mesmo diz, sua comida é “grosseira”, não tem as frescuras dos quitutes granfinos, mas tem “sustança”, mata a fome (a cobra) e mostra o pau.

Uma vez saímos, ele, eu e o finado Miguelzinho da Olga, e fomos dar com os costados em Esmeraldas. Fazia um belo dia de sábado ensolarado, o Miguel dirigia a sua velha “Caravan” esverdeada, éramos muito mais jovens do que hoje, dispostos, e curtíamos adoidados esses programas de índio improvisados.

Chegamos a Esmeraldas, tomamos umas louras geladas num boteco próximo ao mercado, compramos lá uma perna de cabrito, cebolas, batatas e tempero caseiro, e voltamos pra Renascença, onde o “Negão” preparou e assou o cabrito no terreiro da casa do Miguel, debaixo duma velha goiabeira. Foi um sábado grandioso aquele! ...

Mas o “Negão” tinha lá suas trapalhadas, como aquela do dia em que deixei meu “Opala Comodoro” 1979, quatro cilindros, beije, cara chata, um portento de carro, pra ele fazer a troca do cabo da embreagem que havia quebrado.

Fui trabalhar e voltei às dezoito horas, conforme o combinado. Chego à oficina e nada do carro, tampouco do “Negão”. A oficina com o portão principal aberto (uma de suas manias), pensei comigo “- Ele foi testar o carro, logo volta” .

Daí a pouco chega o Costinha correndo, um garoto que ajudava o “Negão” na oficina. Esbaforido, tomou um pouco de ar e sapecou:-

“- Seu Roberto, que bom que o senhor chegou! O “Negão” tá preso ali perto daqueles prédios da “Líder”, na Bernardo de Vasconcelos. Ia me levar em casa e deu de cara com um comando da PM. Não tinha os documentos do carro, sua carteira tá vencida e o bicho pegou. Vamos lá, pelo amor de Deus! ...”

“- Calma, Costinha. Vamos lá que a gente resolve. Fica frio.”

Quando chegamos ao local, havia um microônibus cinzento da PM estacionado e o meu “Opala” encostado, logo atrás. Vi o “Negão” com mais uns dois sujeitos lá dentro, grampeado, ele amarelo feito cera. Dirigi-me ao sargento que comandava a operação, identifiquei-me, expliquei o ocorrido e consegui livrar a cara do compadre Gerson, mas o carro ficou preso, segundo o policial “sob a custódia do Estado”. Eu poderia resgatá-lo no dia seguinte no pátio do Detran, na Gameleira.

Na manhã seguinte, bem cedinho, passei na oficina e fomos no “Fiat” do “Negão” pra Gameleira atrás do meu “Comodoro”. No final, chateações à parte e fora uma trava mecânica de volante que sumiu , retiramos o possante de lá, o “Negão” pagou as despesas e terminou tudo bem, apesar do susto que ele, mais do que eu, levou! ...

B.Hte., 20/06/08 -o-o-o-o-o-

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 28/10/2009
Código do texto: T1891107
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