Os outros somos nós

Quantas das palavras que usamos no cotidiano nós as pronunciamos sem o sentimento correspondente aos seus significados? Palavras que, tal como nós mesmos, não exprimem, simplesmente pelo fato de existirem, o partilhar necessário para que os outros ouvidos lhes recebam com a profundidade que elas contêm? Nós, como as palavras, desperdiçamos o que significamos em tentativas frustradas de partilharmos nossas vidas com os outros. Quando nos esforçamos para que nos entendam. Quando nos emocionamos e queremos que esse sentimento seja absorvido na íntegra para que os motivos que nos levaram às conclusões que chegamos sejam suficientemente entendidos e partilhados. É preciso que haja um dom em algumas pessoas para que elas sejam compreendidas. Outras vezes é preciso técnica para que suas pretensões se realizem. Porém a grande maioria não consegue índices significativos. Fica numa espécie de solidão. Seus recursos reduzidos exigem uma empatia dos demais que somente uns poucos se dispõem a praticar e essas pessoas, tal como as palavras, vagam sem a consideração que sua existência mereceria. Suas emoções ficam ilhadas, ou pelo mutismo de suas impossibilidades, ou pela indiferença de seus próximos. Evidentemente as palavras possuem apenas o significado e as pessoas, estas são complexas. Manipulam deliberadamente as palavras e, com isso, despertam a desconfiança. Seus inconscientes mascaram suas demonstrações e repelem as absorções. Quem sabe haverá o dia em que as palavras não sejam mais necessárias. Sejam instrumentos arcaicos de comunicação, substituídas por um instrumento que passe literalmente intenções e sentimentos para os interlocutores e vice-versa. Sem ruídos, sem parcialidades, sem dissimulações... Aí, as palavras serão lembradas apenas como forma de arte. Como registro de quem já não pode usar a nova forma por não estar presente, e nós afinal nos entenderemos com a nobreza que o entendimento entre as pessoas tanto esperou para colocá-las no patamar que sempre desconfiamos que existisse, mas carecíamos de merecimento, de evolução para alcançar.