A Luz se Apagou

Foi um dia muito quente, desses de derreter asfalto, e tudo o que eu queria nessa volta para casa no fim da tarde era um chuveiro frio, vestir minha Bermuda e andar descalço pela casa.

Eis que o celular grita anunciando uma chamada. Era meu irmão chamando para uma pizza em sua casa, para comemorar um sei lá o que. Logicamente aceitei, porque convite de irmão é coisa rara e tem de ser prestigiado.

Liguei rapidinho para minha esposa e determinei que ela se aprontasse pois iríamos à casa do meu irmão.

Cheguei esbaforido, louco pelo banho de ducha, e, com o beijo mal dado segui me despindo até o banheiro para aplacar o calor que sentia.

Nada estava errado.

Coloquei a desejada bermuda, uma sandália e uma camiseta completaram o figurino. Nisso minha esposa já estava pronta e perfumada, coisa rara para ela, pois certamente pôs e tirou diversas peças de roupa até escolher a mais casual possível (coisas de mulher, fazer o que?).

Fomos conversando sobre amenidades e, quase sem perceber chegamos ao destino.

A pizza estava ótima, a conversa boa, mas tínhamos de ir embora, pois o sono nos chamava.

Foi então que aconteceu algo inusitado.

Meu irmão mora no décimo segundo andar de um edifício novo. Na verdade a comemoração era pela compra do imóvel que tinha se concretizado naquele exato dia. O detalhe é que foi determinante para o que viria a acontecer.

Por ser muito novo, nem tudo funcionava como deveria. No caso o que ainda não funcionava plenamente era o gerador elétrico. Na verdade ainda não estava instalado, mas quem precisa de um gerador?

Acontece que quando estávamos entre o andar dez e nove, na descida, tudo se apagou, e o elevador parou.

Ouvimos gritos e pessoas batendo nas portas dos andares, e certa balburdia que durou certo tempo. O calor continuava implacável, e dentro da caixinha do elevador, sem ventilação, tudo parecia pior, mais quente, mais abafado.

Pouco a pouco o silêncio foi dominando juntamente com a escuridão, que, àquela altura, já nos acostumáramos.

Pessoalmente sou muito calmo e na exata e inversa proporção da gravidade da situação, mais eu me acalmo. É um truque para vencer dificuldades. Assim, diante de algo muito grave, tanto maior será minha paciência para resolver.

A única coisa que me deixa inseguro é a ausência de informação, e naquela situação não sabíamos de nada, não tínhamos nenhum contato com o mundo exterior, nem ninguém sabia que lá estávamos.

As horas passavam lentamente. Uma, duas, três... o tique taque do relógio de pulso, que normalmente passa sem que o notemos, parecia o de um carrilhão. Celular não tinha sinal, porque a cabine do elevador era blindada. A câmera dessa célula devia estar desligada com o apagão e nós estávamos lá há três horas...

Como nada havia a fazer, pegamos no sono.

Um clarão nos acordou, seguido de um tranco.

Era de manhã.

O jeito era chegar em casa, tomar aquela ducha fria, vestir novamente o terno, gravata, e enfrentar o calor da quarta-feira.

Almir Ramos da Silva
Enviado por Almir Ramos da Silva em 13/11/2009
Código do texto: T1921580
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