De passagem

Entro e logo sinto cheiro de gente, de muita gente, cheiro de calor, insuportável. Esse cheiro é cotidiano, mas eu ainda não me acostumei, e talvez nunca irei.

Como tudo ainda pode ficar pior, a situação fica péssima. O mundarel aumenta e o espaço que eu ocupava agora apresenta 5 pessoas. Chega um momento em que dá até medo de toda aquela gente se empurrando para entrar também. Quem manda é o instinto animal, e parecemos mesmo animais enjaulados, que são forçados a conviverem juntos. As pessoas deixam lá fora tudo que aprenderam sobre respeito e educação. O importante é chegar logo. Se é preciso passar por isso, elas passam por cima.

A questão é que ninguém as obrigou a estarem aqui, elas se submetem porque querem, querem chegar e ponto. Cada um de um lugar diferente que vai para um lugar diferente e se encontra no caminho. Pelas circunstâncias, não há escolha, elas devem estar aqui para chegar onde querem chegar. Algumas sem saber ao certo o caminho, seguem o fluxo para tentar encontrar.

Pessoas que aqui parecem macacos segurando nos canos ao invés de cipós, com os braços para cima e suvacos à mostra. É inevitável, você tem que conviver com o cheiro dos outros, com o cheiro do suvaco dos outros, todos os dias.

O suor transborda assim como o povo. O limite aqui não existe. O braço de um na barriga do outro, a mão do outro na perna de um, a bunda de um nas costas do outro, o pé do outro em cima do seu. Parece até uma orgia em que ninguém quis ser convidado.

Todos são encoxados, atropelados e espremidos. Até que os portões se abrem e você se sente livre por alguns instantes, como um imã que se desprende da geladeira.

Livre da multidão eu sou apenas eu. Chego até sorrir, um sorriso discreto de alívio. É como se você nascesse novamente porque achou que não sobreviveria, mas é tão instântaneo que se torna imperceptível.

Em pensar que daqui algumas horas tudo começará de novo. E mais uma vez, eu renascerei.