Vestimo-nos para mentir.... (mulher)

Enfeito-me de ilusão. Passo o corretivo para disfarçar as olheiras de preocupação, o lápis para diminuir os olhos arregalados de apreensão, uso rímel para parecer mais fatal que a simples mortal que sou, uso base para que as marcas de minha humanidade falha não sejam notadas. Um batom claro, para dar a meus lábios que mais calam que dizem, vida e pareçam mais reais, me perfumo pra que meu cheiro de “cadáver adiado que procria*” não magoe os sensíveis narizes de outros iguais. Visto uma roupa bonita, da ultima moda, que gira como a roda da loteria, que sempre cria algo diferente do anterior somente para criar a ilusória dependência de um formato ideal. Calço sapatos que não serão confortáveis aos meus pés doídos de caminhar por veredas pedregosas, mas que me darão o ar de imponência, que tanto encanta por seu caráter fictício. Vou pendurar brincos de brilhantes ironias, pulseiras que algemam na futilidade e anéis que marcam da posse ao sem dono, que brilham ofuscando a beleza da simplicidade das flores.

E caminho, com o som oco dos passos da bonequinha de luxo, que mais parece aprisionada em um quimono de gueixa que limita seus passos mas é adorno perfeito: de encher os olhos! Ilusão adocicada que vai se despir antes de dormir e desmanchar em águas coloridas sua ilusão, e vislumbrar seu rosto diante do espelho e negar ser sua imagem real. E vai deitar solitária com seu falso eu, e sonhar com palácios e castelos de cristal...

Vestimo-nos para mentir....