NA CORDA BAMBA DA ESPERANÇA (BVIW)
 
 


 
A rua estava envolta em névoa. Vozes estimulavam as mais diversas aquisições. A primeira barraca vendia notícias e não havia fregueses:


- Copa do Mundo em 2014! Olimpíadas, 2016! E o ano só começa depois do Carnaval! Vai levar o quê, freguesa?


- Algo sobre política...


Ele ri e mostra as publicações empilhadas no fundo da barraca:


- Duas pilhas com os corruptos pelo valor de uma! Vendo por quilo.


Meu senso de humor responde:


- A política como ela não deve ser. Nem Nelson, nem Rodrigues, ninguém mais aguenta! A pátria de chuteiras, agora em cuecas e meias!


Esboço um sorriso triste (tão estranho sorrir assim) e caminho até a próxima barraca repleta de cartolinas coloridas:


- O que vende aqui?


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Desta vez, nem ironia. Cinismo árido. Mais alguns passos e encontro uma mulher grávida numa barraca pequena. A menor de todas elas:


- Não vejo nada exposto...


- Leio poemas.


- Vende poesia?


- Apenas recito.


- E como sobrevive? Não é seu trabalho?


- Sou cabeleleira. Meu salão não abre aos domingos. Estou aqui como voluntária. Quem sabe, uma inspiração para mais alguém, no meio do dia? Sem poesia não há esperança ou futuro.


Antes de ir embora escuto sua voz mansa:


- "Não sou alegre nem sou triste: sou poeta".


E enfim, sorri. Tudo lembrava um sonho costurado por retalhos crônicos.




(*) Palavras em itálico: frase do poema "Motivo" de Cecília Meireles
 


(*) IMAGEM: Google

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Dolce Vita
Enviado por Dolce Vita em 07/12/2009
Reeditado em 07/12/2009
Código do texto: T1964971
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