Crônica de uma noite mal dormida

Uma noite mal dormida é um caminho aberto para assombrações. Pensamentos ruins, problemas, fantasmas e medos teimam acompanhar as longas horas de uma noite sem sono.

Enquanto a casa dorme e a cidade pára, fica o vazio e a mente a assombrar a gente. Aí é que o sono some. E pula carneirinho, e reza com fervor para ver se acalma a mente impaciente. Os ruídos se multiplicam em barulho, que faz pulsar o mais forte coração. A tevê se torna ingrata, com programação nem um pouco acolhedora. O bom livro torna-se chato e os problemas vêm com todas as forças, sacudindo a gente para que sejam resolvidos rápido.

Aquela palavra que não podia ser dita fica batendo na cabeça. A bronca que precisava ser dada na hora certa vem chateando a essa hora da noite. E nada se pode fazer. Todos dormem. Menos uma mente que cisma em conversar com os sentimentos logo na madrugada.

As menores preocupações e os afazeres do dia seguinte ficam a martelar. Não se pode esquecer... tem que pagar, tem que ir, tem que fazer, tem que falar... Ah! Sim! Está tudo na agenda, mas a mente não deixa esquecer.

Uma noite mal dormida é o suficiente para esquecer o quão fortes somos. É o suficiente para chegarem todas as aflições e fraquezas. Os medos, as ilusões, as verdades. Chegam as verdades que a luz e o burburinho do dia não permitem revelar.

A noite mal dormida é cruel. A mente torna-se uma inimiga.

Equilíbrio... Equilíbrio... Respiração longa e profunda. Om Namah Shivaya... Santo Anjo do Senhor... São Bento, meu bom pai...

Tudo... e nada...

Uma noite mal dormida puxa a gente para dentro, pro que falta fazer, pagar, resolver. E puxa também pra fora, multiplicando os sons e atrapalhando o descanso. É aquele momento em que estamos diante da nossa realidade e não há como fugir das assombrações e dos nossos fantasmas. É esperar o sol raiar, a cidade acordar para vestir novamente a fantasia de “ser gente”.

Rosimere Ferreira
Enviado por Rosimere Ferreira em 18/07/2006
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