A vida Imita a Arte

Não que eu concorde com o título destas letras, mas um dia após escrever o pequenino diálogo “O Fumante e o Segurança” tive uma experiência parecida.

Estava eu no Botafogo Praia Shopping – no andar do Mc Donalds – quando, após uma copiosa refeição, procurei um lugar onde pudesse, sem incomodar ninguém, fazer minha digestão. Não vou me estender aqui sobre o prazer que sinto na digestão, vale a pena dizer apenas que sempre que acabo uma refeição vou procurar algum lugar aberto para fumar um cigarro.

Como sabem os leitores – fumantes ou não –, fumar no ambiente público de qualquer metrópole do país está se tornando mais difícil do que marcar audiência com o Luís Inácio. Sinto que daqui a dois anos, toda vez que eu acender um cigarro receberei, literalmente, uma sova.

Pois bem, estava eu no Shopping e procurei, entre os lugares mais ermos de Botafogo, um lugar onde eu pudesse soltar minhas baforadas. Andei para o estacionamento e, chegando lá, procurei o último poste onde, sem qualquer possibilidade de ser avistado por um cidadão de bem, pudesse eu cometer o criterioso crime. Achei uma varanda no estacionamento. Um lugar arejado que dá para um amontoado de prédios com varandas vulgarmente expostas para os olhares de clientes e funcionários do Shopping. Ali, naquela solidão de concreto, acendi meu cigarro. Um guarda, montado numa moto paramentada, apareceu no terceiro trago.

- O Senhor sabia que não pode fumar no shopping? – disse com um certo ar de impaciência.

Enquanto eu argumentava, ele tirava do bolso do uniforme um daqueles cartõezinhos que iriam esclarecer-me sobre o ato hediondo que eu estava a cometer. Peguei o cartão, argumentei e, por fim, o pobre guarda permitiu que eu acabasse meu cigarro se eu “não deixasse ninguém ver”. Foi neste instante e em nenhum outro que eu me senti um meliante completo, com correntes presas aos meus calcanhares e tudo. Ora, pela primeira vez me vi como um péssimo exemplo, alguém que não pode ser visto.

Pensava eu cabisbaixo e semi-amargurado quando vejo, ao meu lado esquerdo dentro do mesmo estacionamento, uma oficina de lava-jato que trabalhava a todo o vapor com ceras e solventes de todos os calibres que faziam meu nariz coçar. Aquilo era permitido. Aquilo não fazia mal, afinal de contas, quem não quer ter seu carro impecável. A desgraça é a fumaça.

Não é meu objetivo me estender pelo óbvio, ou seja, que sou contra a cláusula proibitiva. Apenas atento-me para o seguinte: estamos ficando por demais intolerantes. Digo e repito: qualquer dia tomarei um joelhaço apenas por acender meu pobre e moribundo cigarrinho.