Vida amarga

Foi a última vez que tentei, juro, de hoje em diante, estritamente negócios e conversas recheadas de palavras unissilábicas para não perder tempo, daquelas em que, quando terminam, deixam uma sensação de “que merda”. Lembrei-me da piada do veterinário que, de madrugada, recebe um telefonema de madame, dizendo que sua cadelinha está “fazendo amor com cachorro enorme. “Jogue água neles”, sugere o veterinário. A mulher retorna: “Não deu certo”. “Grite com os dois”, e volta o telefonema, a mulher rouca: “Doutor, estou sem voz, e nada”. Na quinta chamada, o veterinário desabafa: “Diga que tem telefonema para o cachorro”. “E ele vai parar, doutor?” E ele, irritadíssimo: “Minha senhora, eu já parei cinco vezes”.

Opa! Será que é isso? Ligo em horas tão impróprias? Como é durante o dia e ela diz que está ocupadíssima e não tem tempo para “conversas moles”, como chama qualquer contato telefônico não macambúzio, não deve ser. Mas o “alô” já sai com legenda: “Não me encha o saco”.

A exclusividade não é dela, há pessoas e mais pessoas que acham que o trabalho deve ser tão sério que não admite sorrisos e nenhuma brincadeirinha inocente. Acham que ter prazer no trabalho é pecado e que trabalhamos apenas para produzir e não para nos sentirmos bem. E as empresas investem em valorização de seus colaboradores e em caras palestras de motivação piegas!

Se os funcionários fossem obrigados a sorrir na hora de dizer “alô”, grande parte dos problemas estariam resolvidos. Olha aí: que tal criar mais uma ISO? A ISO da alegria. Para não fugir do padrão de língua utilizada, poderíamos batizá-la de ISS, apesar da confusão com o imposto: International Smile Standard.

Empresas em que os funcionários são tratados como máquinas que não sorriem, produzem bem. As em que eles são incentivados a se sentirem felizes e recompensados por seu trabalho, também. Só que na primeira eles morrem mais cedo, na hora do “pega pra capar” pulam fora e são infelizes.

Quanto à minha amiga, talvez um dia lhe chegue o tempo de descobrir que a vida não foi feita para ser levada a sério demais e que não somos importantes pelas horas de caras fechadas que passamos pela vida, mas pela felicidade que conseguimos espalhar, viver e compartilhar. E a felicidade, por mais serena que seja, comporta sorrisos, e esses não abrem mão da leveza de brincadeiras, por mais inocentes ou “burrinhas” que pareçam. Tomara.