MULHERES DO CALENDÁRIO

Sinceramente confesso minha incapacidade de escrever uma crônica, um conto ou um romance sobre essas mulheres inigualáveis, porém tranquilamente sugeriria aos fotógrafos, aos artistas plásticos, aos designers e aos amantes da arte da imagem uma mistura de perenidade e popularidade: um calendário. Que tal um calendário de mulheres de quarenta anos? Arriscaria batizá-lo “Balzaquianas contemporâneas”.

Janeiro começaria com a Penélope Charmosa de Maringá em vestido transparente pela principal e mais famosa Avenida da Cidade Canção: a Colombo festejaria o sorriso discreto e os motoristas buzinariam em cortejo festivo.

O calor e as festas carnavalescas se concretizariam no sorriso e no gingado deslumbrante da atriz Carla Marins, caminhando em Florianópolis, biquíni branco, chapéu de palha. Toque de classe e bom gosto.

O calendário não teria importância sem a jornalista Ana Paula Padrão. A ela seria destinado o mês de março. Short branco, camiseta azul, cabelos soltos, maquiagem leve e sandálias coloridas imprimiriam a leveza das faces joviais ao corpo de mulher cosmopolita. Deslizaria pelo Parque do Povo em Presidente Prudente (SP) e, ao fundo da imagem, a insinuação de dados econômicos.

Que tal um fim de semana de abril em Petrópolis? Uma quarentona genial e naturalmente bela desfilaria pelas ruas da cidade imperial, esbanjando sutileza e carisma: Sandra Bullock.

Os ventos de maio seriam brindados nos trejeitos e no casaco – menos com finalidade prática do que estética – delicadamente disposto sobre os ombros jubilosos de Helena Ranaldi, cujos cabelos pretos – e preferencialmente após os ombros – seriam presos por uma arco discreto de brilhantes.

Junho exigiria a delicadeza e sugeriria o sorriso de uma linda mulher. Sugestões? Julia Roberts ouvindo Ravel ou Chopin no rompimento do crepúsculo nas areias de Lucena (PB). O espetáculo da metamorfose das cores no horizonte ensejaria alguns suspiros de angústia e do medo natural das aventuras efêmeras.

As noites de Julho nos impelem a ficar agarradinhos na chuva, na fazenda ou numa casinha de sapê. Paula Toller desfilaria em um jogo de luz e sombra nas fachadas da Quinta da Boa Vista.

Agosto constitui-se na mistura do gelo que teima em ficar e do calor que insiste em arrombar a porta da primavera. A voz esplêndida de Drica Moraes poderia vir de brinde. Vez por outra teríamos o privilégio de apertar um botão e ouvir declamações de poesias de Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa, Cecília Meireles, Affonso Romano de Sant’Anna ou Antônio Lázaro de Almeida Prado.

Se Setembro indiscutivelmente traz os benefícios das melodias dos pássaros reunidas aos desejos intransponíveis das árvores de passearem nas redondezas e estabelecerem novas amizades, Maria Padilha desfilaria em alguns trechos floridos do Parque João Domingos Coelho em Assis, óculos escuros ameaçando despencar dos cabelos.

Nada possuo contra mulheres na política. De modo que Outubro estamparia a sacada da Casa Rosada e, envolvida na faixa presidencial argentina, Cristina Kirchner posaria numa mistura invejável de beleza e autoritarismo.

Ainda na política, talvez convidássemos a monarca da Jordânia para figurar em novembro. A rainha Rânia desprenderia as maçãs e destacaria os olhos harmônicos e multicoloridos em uma foto fechada sobre eles.

Dezembro, espaço em branco. Os compradores do calendário elegeriam a mulher balzaquiana contemporânea que mais lhes despertasse interesses. De maneira fugidia, discreta, secreta, acanhada ou angustiante, roubariam uma foto empunhando a câmera fotográfica atrás de uma árvore, na fila do supermercado ou entre a entrada e saída de veículos em um estacionamento qualquer.

As meninas, as adolescentes e as jovens me desculpem, mas maturidade é fundamental. Se eventualmente o calendário das “Balzaquianas contemporâneas” saísse, eu compraria uns trinta ou quarenta para espalhá-los nos locais que geralmente freqüento, sempre dando um jeito de grampear as folhas a fim de que março se eternizasse todos os dias, todos os meses, todos os anos.

*Publicado originalmente no Jornal de Assis (Assis – SP) de 17 de dezembro de 2009.

Vicentônio Regis do Nascimento Silva (www.vicentonio.blogspot.com) é crítico literário e tradutor.