MINHA VIDA DE FELLINI 





Não gostaria de ser transparente a este ponto, afinal sou atriz. Estrela? Abençoada por uma. Tive sorte ao encontrar Federico no caminho. Ele lutou para que fosse atriz dos seus filmes porque não me enquadro nos padrões de beleza do cinema. Dizem que tenho uma personalidade forte, sou uma rocha. Talvez pareça forte por ser otimista. Tenho fé e esperança. Sem Federico não conheceria o mundo, nem o mundo a mim. Ontem estava em Cannes, honrada com o prêmio de melhor atriz por "Noites de Cabíria". Hoje, aqui, diante da maior plateia de estrelas da face da Terra.


Federico sofre para me dirigir. Muitas vezes invado a linha do seu comando para impor a minha percepção da personagem, mas cabe a ele o domínio do filme e sua alma criativa se estende por todos os poros da história. Para atuar com este diretor é preciso ser matéria prima que aceita o molde. No entanto, sou rebelde. Esta é minha legítima felicidade: amo o cinema. Amo Federico. Não necessariamente nesta ordem ou em ordem...


Se ainda não me conhece, sou Giulietta Masina. Atriz e esposa de Fellini. Hoje recebo, em seu nome, o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro por "Noites de Cabíria". Ele não esperava ganhar por dois anos consecutivos: "A Estrada da Vida" onde interpretei Gelsomina e agora, Cabíria. Duas mulheres que criou e dirigiu. Coube a mim representá-las. E rodar o mundo com minha vida de Fellini. Não estarei em seu próximo sonho e motivo de sua ausência hoje, mas esclareço: não sinto ciúmes de "La Dolce Vita".


Prometi que não choraria, Federico, mas não consigo. Você me conhece melhor do que ninguém. Emotiva, intensa e desajeitada demais, ergo a  estatueta em teu nome:


- Viva o cinema! Viva Fellini!








(*) IMAGEM: Giulietta Masina, em "Noites de Cabíria". Protagonista de dois dos quatro filmes de Fellini premiados com o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro,  representou  o cineasta na cerimônia de premiação por este filme que ilustra a crônica. Giulietta foi casada com Fellini por 50 anos (1943 - 1993) e morreu cinco meses após o falecimento do cineasta.



(*) Esta crônica mescla ficção e elementos biográficos da atriz e do cineasta além de passagens que pertecem à história do cinema.





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Dolce Vita
Enviado por Dolce Vita em 21/12/2009
Reeditado em 30/09/2011
Código do texto: T1989244
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