Do gesto à exaltação

O silêncio, tomado por um certo tormento, implora pelo seu término.

Começam então os burburinhos ao pé do ouvido, que pouco a pouco passam de forma cadenciada àqueles que estão à mesa. Estes, por sua vez, entreolham-se e arriscam um movimento de aprovação simultâneo.

Como num gesto teatral, a mão direita de certo um é alçada aberta, e como um dominó, seus dedos caem um sobre os outros, mimicamente mostrando a cobiçada nota.

Logo na frente, dono de um olhar fixo e apreensivo, o outro um corresponde com firmes palhetadas que tremulam ora as cordas, ora os ouvidos de quem está de imediato, e sempre ritmadas por um balé dedilhado daquela mão que ampara o braço do cavaco

Majestosamente surge uma certa marcação, rasgando de forma metralhada o compasso do cavaquinho, e logo em seguida entrelaça-se pulsante, feito batidas de coração, com as palhetadas ritmadas de seu vizinho.

Neste momento, já com o peito oprimido pela ansiedade da espera, dar-se-á a chegada do pandeiro ao som esvoaçante e estridente de suas platinelas. Sua pele, de início, é tangida de forma brutal pela palma da mão e alternada pelo polegar, onde se revezam interminavelmente palma polegar-polegar palma, num intenso namoro, fazendo seus confinantes entrarem em transe, percorrendo o tom, que de início fora desejado.

Já harmonizados, todos os outros, não menos importantes, surgem. Tamborim, reco-reco, cuíca e as batidas na palma da mão, que desfrutam daquele pandeiro, que por mais bruto, dá o ensejo. A marcação, por menos estável, é segura em seu tempo. E o cavaco, que por menos triste, chora, transbordando o suspiro melódico do poeta que está prestes a ser exaltado.