Sopa

Era educada demais. Sentou-se com cuidado e perguntou se não incomodava. A outra mulher respondeu que não, naturalmente, foi quase automático. Quando ouviu a resposta, ajeitou-se para que seu vestido não ultrapassasse o limite de sua poltrona. Em seguida, pousou delicadamente a bolsa no colo e sorriu. Estava louca para sorrir desde o momento em que resolveu sentar-se ali. Se a mulher que estava na poltrona ao lado tivesse dirigido-lhe o olhar, teria sorrido mesmo antes de aproximar-se. Agora, já acomodada, poderia sorrir com mais ênfase e sinceridade. Os dentes amarelados apareceram entre os lábios de batom rosa. Aquele era o momento decisivo, tudo dependia daquele sorriso.

– Tudo bem?

– Tudo maravilhoso! – Ela disse desfazendo o sorriso, mas ameaçando sorrir ainda mais. – E com você?

– Muito bem, obrigada – a outra mulher respondeu ainda meio abafada pelo sorriso.

– Está indo para casa?

– Estou sim, tentando chegar em casa para preparar o jantar – ela trazia algumas sacolas: batatas, cenouras e um pacote de macarrão.

– Meu nome é Judita e o seu?

– Graça, Maria da Graça – a mulher enfatizou.

– Muito prazer, Graça – mais um sorriso.

– E a senhora, aonde vai?

– Ainda não sei, estou apenas apreciando o passeio.

– Passeio?

– É! – ela sacudiu a cabeça freneticamente. – Desses que não importa para onde vamos.

A mulher olhou um pouco desconfiada e resolveu descer dois pontos antes de sua casa.

– Vou descer neste ponto, a senhora me dá uma licencinha?

– Não se preocupe, vou descer aqui também.

– Mas, já acabou o passeio?

– Já sim – ela disse com toda a calma. – Prefiro sopa de macarrão com legumes a passear de ônibus.

Fillipe Evangelista
Enviado por Fillipe Evangelista em 28/12/2009
Reeditado em 29/12/2009
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