SAUDADES DOS ANOS 50

Num desses dias de recesso escolar e de certa tranqüilidade, me vi, de repente, sozinho e o pensamento me fez retornar aos anos 50, quando ainda morava em um grande sítio, bem próximo da atual moradia.

Apesar de lá ter vivido apenas três anos e pouco, conheço bem a vida rural. Sei o que acontecia nessa época, pois já na juventude voltei a morar por dois anos num outro sítio, com as mesmas condições da primeira moradia.

Ali pude então constatar como meus pais eram felizes nessa época de vida, apesar das dificuldades da locomoção.

Logo de manhã, acordava com cantar dos pássaros e então ia me deliciar com o saboroso café com leite e os quitutes de minha tia. Assim que terminava o café, se não havia outra coisa a fazer, tratava das galinhas e porcos, para depois dar umas voltas pelos arredores da propriedade, onde encontrava os amigos.

Costumava, vez ou outra também, descascar e debulhar grandes quantidades de milho, que seriam usados para o trato dos animais e também para o fabricação de fubá e farinha de milho.

Chegou a hora do almoço e a mesa bem farta com feijão, arroz, farinhas e carnes de animais criados à solta no sítio.

No período da tarde, as coisas continuavam como de manhã, como já vimos, pois a vida seguia seu rumo normal.

À noite esperávamos o jantar, jogando truco, palitinho ou dominó, enquanto um rádio a pilhas nos alegrava com músicas sertanejas. Eram os bons tempos da Rádio Nacional (hoje Globo), Radio Record e Radio Nove de Julho, que nesse horário já produziam programas sertanejos, com apresentadores de respeito na época como Geraldo Meireles (o Marechal da Música Sertaneja) – Zé Russo – Luiz Pedro de Araújo – Nhô Zé (José de Moura Barbosa) e tantos outros que não consigo lembrar no momento. Nesse tempo iniciavam suas atividades várias duplas sertanejas, hoje não tão lembradas.

Fiquei então pensando nas maravilhas dos anos 50.Como era bom! Não se falava em colesterol, stress, hipertensão arterial e tantos males que assolam os anos, a partir de 1990.Não se falava com muita freqüência em crimes hediondos e as guerras também não faziam parte dos comentários que eram feitos em todo os lugares de pequeno porte.

Nos dão saudade também as festas da zona rural, aonde o padre, chegando na 5a feira, só retornando a cidade no fim da tarde de sábado.As rezas e missas, rezadas ou cantadas eram muito concorridas e após, havia leilão de prendas e donativos.

PAREI... O PENSAMENTO ESTA DISTANTE!

Sinto-me distante no tempo e no espaço.

São anos de volta ao passado, relembrando os bons ou tristes momentos, isso não importa.

Não posso controlar o pensamento.

Como num filme, me vejo no final dos anos cinqüenta.

Embora vizinho da atual moradia, meu avô, por motivos vários, teve que se desfazer do sitio, grande e bonita propriedade, na qual vivi apenas três anos e meio e para onde custei a voltar.

Quando voltei, nos fins da década de 60, a mudança foi

brusca.Muitos dos moradores tinham se espalhado por outras regiões e ate deixaram o Brasil.

O foco das atenções deixou de ser a agricultura e pecuária, para a monocultura do eucalipto, desprezando-se as raízes da cultura regional.

O antigo visual privilegiado passa a ser apenas de um produto.

As distâncias se encurtaram pela entrada de automóveis, até mesmo importados, caminhões em detrimento de nosso saudoso carro de bois.

A moenda, coitada, já apodreceu...O moinho já não produz mais o farelo e o fubá...O monjolo não produz mais a quirera e a gostosa farinha de milho, hoje motivo de descaso de algumas pessoas que se sentem prejudicadas por sua ingestão.

Ah! Já não se faz mais a gostosa cachaça de alambique.

Os mutirões também ficaram para trás, pois os mais novos não tem tempo de trocar dia, já que são empregados em diversos setores, que não lhes permite folgas.

E das danças de catira e dos jogos de truco até altas madrugadas, quem se lembra disso.

Como éramos felizes!

Comíamos do bom e do melhor, bem simples, mas de boa qualidade, pois eram plantados sem nenhum agrotóxico ou adubo.

Ninguém sabia o que significava colesterol ou outra doença dos tempos atuais.

Ah! Os partos eram normais, assistidos por parteiras, geralmente, comadres das gestantes, que resolviam tudo em pouco tempo. E lá vinha um novo ser ao mundo.

A mãe recebia a visita das vizinhas que geralmente traziam frangos caipiras, pois as mulheres deveriam se alimentar bem nos dias de resguardo (40 dias após o parto).

Rapidamente se convidava alguém para apadrinhar o novo rebento, que em poucos dias recebia o batismo, sem a necessidade dos atuais cursos.

Lembrando das festas populares, vem nos à memória o fogueteiro, que ia á frente das procissões, soltando os antigos rojões de vara.Perigosos, mas cobiçados pelas crianças que eram espaventadas quando deles se aproximavam.

E o capelão das rezas?

Esse chamava a todos para a oração e não gostava do barulho nos terreiros das casas e nos pátios das comunidades.Eram as festas nas comunidades ou rezas de novenas das almas.

As crianças se escafediam e só retornavam para a hora do café, que nunca era “assobiado” e sim acompanhado de quitutes preparados com muito carinho Em casas muito simples quando só se servia o café puro, dizia-se também que era “com mexido de língua”; mas isso era muito difícil.

A fartura era grande e também o esforço dos que acolhiam os rezadores em não deixar faltar a “mistura” para o café. •Nesse tempo tudo era motivo para festas. Podia ser batizado, casamento, mutirão, dia de algum Santo”.

Os velórios eram um capítulo à parte.

Normalmente numa casa grande, o velório varava a noite e entre uma reza e outra havia cantos e logicamente uma parada para “forrar” o estômago.

Nessas paradas eram servidos cafés, quitutes e até almoço ou janta, dependendo do horário do acontecido.

Não havia velórios das funerárias e o defunto era lavado e vestido em sua própria casa, pelos parentes, que sem condições de comprar caixões acabavam por fazê-lo no meio tempo entre a morte e o enterro.

Nesse meio tempo o corpo era velado coberto numa cama de solteiro ou do próprio casal, na sala da casa.

Vindo da zona rural era trazido por pessoas que se revezavam ao longo do percurso, cantando e rezando.

Há, de outro lado, muitas histórias hilárias de velórios e enterros, que incluem também a “marvada”.

Mas vamos deixar isso para outro momento, se Deus quiser!

Carvalho Santos
Enviado por Carvalho Santos em 25/07/2006
Reeditado em 16/04/2009
Código do texto: T201709