Eia, elha
Gerônimo era um matuto.
Nasceu nos cafundós da Bahia e não teve nenhuma instrução, seja do ponto de vista educacional, seja do ponto de vista de estudos.
Apesar disso, era inteligente e muito esforçado.
Acordava cedinho, alimentava as galinhas, os porcos, lavava as baias, os coches, escovava os cavalos e antes das 10 horas já ia roçar o café.
Depois do almoço sempre cuidava da horta e fazia reparos nas casas do sítio onde morava.
Seu José Ramos era o dono daquelas terras e sempre que o Gerô (assim Gerônimo era conhecido) fazia alguma coisa a mais do que as suas funções, ganhava do patrão um trocadinho.
E ele sempre fazia algo mais. Fez tanto que aprendeu, por observar outros, como consertar telhados.
Aprendeu muito bem esse ofício, tornou-se mestre.
Passeando por outros sítios vizinhos Gerô oferecia seus préstimos, gritando: -- “Conserto teias e teiados”. E dizia a plenos pulmões, assim mesmo: teias e teiados.
Havia uma vizinha, jovem professora, que andava inconformada com esse jeito capiau de falar e ralhou com ele, dizendo para ele prestar atenção, que não se dizia teia, mas telha... telha, repetia. Também não se diz teiado, mas telhado, entende? Perguntava ela repetindo: telha, telhado.
Gerô era humilde o suficiente para aceitar o conselho. Passou a andar pelas estradas da região repetindo a lição para não esquecer. Telha, telhado...telha, telhado...
Certo dia, com a lição na ponta da língua, escolheu a roupa que costumeiramente usava aos domingos ou em dias de festa e seguiu faceiro para a casa da professorinha. Queria mostrar o que aprendera, e que aplicara o conhecimento a outras palavras.
Chegou à casa, gritando muito eufórico, até que a moça veio atendê-lo.
-- Dona Maria, disse ele, venha ver as novidades... agora não conserto mais teias e teiados. Conserto telhas e telhados... e ainda limpo as telhas de aranha e ponho telhado melha cana ou cana inteira, ao gosto do freguês.
A professorinha teve de aceitar o discurso, afinal, ela pediu e ele atendeu.
Eia, não. Elha sim.