DIANTE DO ESPELHO

Ela dizia para si mesma que era feliz. Um método até estranho para tentar se enganar diante do espelho. Esta atriz caída, ainda aos quinze anos, esta modelo não invejada e esta estudante desiludida se tonara um retrato real do que era um agouro típico da adolescência enganada. Os hormônios, os hormônios, era a disculpa que diziam para ela, Beca para os intímos e Rebeca para os pais. Roupas novas e óculos recém lançados, a moda que antes era falta de agora é uma explosão. Crescera alguns sentimentros, se acha gorda sempre, estigmas de uma idade onde nada é tão sério quando é sério. Fizera uma festa para comemorar seu aniversário em janeiro. Dançara valsa. Ela dizia para sí mesma: “estou feliz!”

Rosto maquiado, voltara as aulas mas não veste uniforme ainda, não é obrigado nas primeiras semanas, tem cinco dias para mostrar quem é antes de usar uma roupa pré moldada. As amigas abraçam e a chamam em todos os cantos, eis a flor que dança nos cantos da sala curtindo os sorrisos de sua menina exterior.

- E as férias? – pergunta sua amiga mais íntima. Conheceram – se há 3 anos e sempre fazem confissões uma a outra. Seus segredos mais bobos e suas verdades mais íntimas. Beca ou Rebeca sabia que perderia sua amiga em breve, os poucos anos de estudo se transformariam em uma competição e sua amiga ficará em segundo plano. Uma infância que corre pelos dedos e se faz impossível de agarrar. E as férias? Foram boas sim.

Hoje já não se diz mais recreio, hoje se diz intervalo. São vinte minutos onde quando novo se corre e quando jovem se conversa. Ainda sim leva-se umas trombadas repentinas de crianças tentando pegar outras crianças em seus jogos pueris. Gasta-se um tempo na compra de algum salgado com refrigerante, gasta-se outro tempo ouvindo as conversas. Ainda há festa na volta à sala mas durará pouco com o segundo toque. Sentam-se todos!

Meninas cuidam melhor de seus livros, principalmente os caros. Nos mesmos inuteis do qual ela carrega em baixo do braço para todas as aulas. Sua bolsa é para alguma maquiagem comprada para se mostrar e não para se usar. Recebera uma flor do garoto estranho da primeira fila, ela não o conhece e nem o ama, alias, ela o repudia como todos naquela sala o repudiam. O que fizera? Ser diferente é um crime tão cruel que deve ser pago com a solidão. Rebeca não pensara no assunto, não deve perder seu tempo com estranhos. A flor vai para o lixo. Beca se tornará em breve Rebeca, como os seus pais a chamam. Beca perdera seus sonhos e suas ilusões. Beca não se tornara nem atriz, nem modelo. Quando Beca se torna Rebeca significa que ela casou-se, que tem dois filhos, que visita os pais, que tem um emprego, que faz academia, que sua amiga partiu. Não casara com o garoto da rosa no lixo, não casara com o seu namorado dos 16 anos, não casara com um professor do qual fora chegada. Casara simplesmente com um colega de trabalho, do qual passara após concurso público. Cuida dos filhos e paga escola para os mesmos, a menina sempre cuidara melhor dos livros caros, o menino sempre será o mais sapéca pois como o cão odeia o gato e o gato odeia o rato a vida tem que ser do jeito que fora escrita para os desenhos dos sábados matutinos. Hoje Rebeca, aquela Rebeca, a antiga Beca olha-se no espelho e diz para si mesma que é feliz. Faz isso sem sorrir.