O VELHO E O MUAR

Prof. Antônio de Oliveira

aoliveira@caed.inf.br

Era uma vez... um burro, uma criança, um velho. Um sofrido burro palmilha sofrido caminho, estrada afora: estrada do burro, da criança, do velho pai.

CENA I - A criança monta o burro

Um velho, canhestro, puxa o burro pelo cabresto.

Em certa altura... transeuntes afoitos brandindo a foice e sussurrando:

– Absurdo! O velho a puxar o burro, a montar-se no burro o garoto,

todo maroto. Já não se respeitam os velhos como antigamente!...

CENA II - O velho montado no burro

O garoto, deposto, puxa o burro. Logo adiante, uma pouca de gente,

olhar displicente, fala (im)prudente:

– Imagine só! O garoto a puxar o burro. A montar-se no burro o dono do burro que ainda aparenta ser forte pra burro! Já não se consideram as crianças

como antigamente!...

CENA III - Um no arreio, outro na garupa

Afinal, burro é burro. Carga sobre carga, se o arreio não arreia e o asno não titubeia – que diferença faz? Um no arreio, outro na garupa, lá se vai a dupla.

E o magote de gente exclama:

– Pobre burro! Além da carga, a sobrecarga.

Já não se poupam os animais como antigamente!...

CENA IV - A pé, um quadrúpede e dois bípedes

Burro, criança e velho. E, por ordem: primeiro, o velho; a criança segue atrás, emburrada; depois, alinha-se o burro. Todos a pé, dois bípedes, sobre os próprios pés; um quadrúpede, sobre as próprias patas. E a turba recrudesce:

– Tal pai, tal filho... Ambos: burros pra burro! Só faltava essa...

CENA V - Pai e filho empurram o burro

Pai e filho, bem-intencionados, porém cansados, abatidos e exaustos,

tentam carregar, ou pelo menos, empurrar o burro... E aí, paisagem insólita,

no empurro, definitivamente não se sabe quem é o burro... ou o mais burro!

EPÍLOGO

Moral da estória, que não é estória, é história, de memória, de otários, de platéia e protagonistas, artistas e espectadores, políticos e votantes de cabresto, marqueteiros e incautos, invasores de privacidade e consumistas voluptuosos. Num mundo de donos da verdade, de tanto ouvir palpiteiros de plantão ora se banca o burro ora se dá até com os burros n’água...

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 12/02/2010
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