REALITY SHOW...É A VIDA!

Não faz muito tempo, eu apressadamente passava pelo centro velho de São Paulo e minha perplexidade advinda de poucos minutos de observação do entorno me valeu um texto "AMOR SOB A MARQUISE", aqui publicado, aonde uma catarse do meu coração me instigava a me reforçar na alma a certeza de que o quê eu via haveria de ser escrito.

Dia desses convidada a publicar , por ocasião do aniversário da cidade, algo bonito sobre São Paulo, senti vontade de ceder o tal texto, mas com certeza seria rejeitado pela redação.

Na verdade, não senti vontade de publicar nada.O siLêncio muitas vezes é ouro, e de fato, fala mais alto.

Nasci na capital de São Paulo, cidade que amo, nos meados de sessenta, e da minha infância tenho cenas remotas dum centro da cidade bem diferente do dos dias de hoje.

A praça da Sé que acolhe a sua belíssima Catedral era um reduto de encontro de famílias para a missa do Domingo, e embora digam que o cenário se revitalizou por obra de alguns gestores que se sucederam a cuidar da cidade, na verdade o que nos sobrou do centro velho é a sua História, algumas parcas lembranças boas, e a triste e crescente degradação social, que no palco da sua belíssima e arrojada arquitetura empoeirada e erosionada, encena o teatro das mazelas humanas patrocinado pela delinquência fora de controle, acionada pelas cortinas da negligência do poder público.

Ressalto que o combustível desta minha crônica me veio duma reportagem que vi ontem pela televisão, num desses programas mais populares e em tempo real, e que embora apenas deslizasse correndo pelo meu controle remoto, não pude deixar de me interessar pelo que ali se mostrava: O meu "AMOR SOB A MARQUISE", agora estava lá, a céu aberto, encenado por um casal acalorado e pelado a "fazer amor" no chafariz do lago em frente a catedral da Sé, já abençoado pelo repicar do sino da grande igreja, que soava emocionado.

Muito bem, parece que foram devidamente respeitados, aliás, aonde tem amor tudo está perdoado.

Cena mais que interessante e competitiva num mundo de BIG BROTHER BRASIL.

Depois daquilo não tem para emissora nenhuma um IBOPE MELHOR, ao vivo e às cores opacas da vida real, correto?

Errado! No belo "cartão postal" as pombas sobrevoavam tão alheias ao casal, quanto os transeuntes da praça, provavelmente mais que acostumados a outras cenas horrorizantes de abandono de menores, de toda sorte de violências, de descaso e de drogas. E do total desamparo "do IBOPE" de quem cuida, ou deveria cuidar. Não fosse o celular duma emoção mais aguçada, e eu não estaria aqui escrevendo. Os jornalistas estavam boquiabertos.

Mas por quê, afinal, alguém puniria um ato de amor inofensivo frente a tanta tragédia que se encena ali, no centro velho de São Paulo, inclusive sob os olhares mudos dos altares Santos?

Alguém fundamentaria: Atentado violento ao pudor. Não sei, pudor é algo relativo. Moral e costumes variam de tempos em tempos, de sociedade em sociedade ao longo da História do Homem.

Eu exemplifico: O quê temos visto nos principais cenários políticos do país e do mundo, por acaso, não seria também uma forma de atentado violento ao pudor, à ética e à moral dos tempos? Não sei, tudo é muito relativo no reality show da vida. De toda sorte, políticos saem do povo. É a sua amostragem social e comportamental mais fidedigna.

Paredão neles todos!

Viver é relativo, pensar e enxergar...mais ainda!

Se havia policiamento na Sé, acredito que eternecido, também resolveu fechar seus olhos, dar graças e respeitar o tempo...e o templo do amor! Um templo a céu aberto, que nos coloca o pensamento a meditar sobre os tantos porquês que nos sobressaltam nos nossos dias e a rever todos os conceitos.Inclusive os de moralidade, algo tão banal para um tempo moderno.

Todavia gostei do show da vida. Simbólico, mais que ilustrativo, sem manipulação de audiência, sem o ofuscamento do edredom, e sem os vaidosos holofotes de Pedro Bial e companhia ilimitada.

Digo ao cinegrafista anônimo do celular que filmou as tais imagens que, sem dúvida alguma, o meu voto é pra eles!

Para o casal pelado no OFURÔ da praça da Sé.

Nada a contestar, porque...

*Se "era" amor...invade e fim.

* alusão a PÉTALA/ música de Djavan-