REFLEXÃO SOBRE A MINHA HISTÓRIA

O escritor mineiro Rubem Alves escreveu em uma de suas crônicas: “Eu estou onde estou porque todos os meus planos deram errado”. Uma alusão à sua própria vida. E ele disse isso em resposta a um aluno que lhe fez a seguinte pergunta: “Como é que o senhor planejou a sua vida para que chegasse aonde chegou?”.

                A crônica em questão chama-se “Se eu pudesse viver de novo a minha história...” e foi uma espécie de contraponto à outra crônica de autoria desconhecida chamada “Instantes”, que é uma crônica onde seu autor faz uma advertência aos mais jovens dizendo que tudo o que possuímos é o momento e que jamais se deve perder o agora. Frases como “Se eu pudesse viver novamente a minha vida, trataria de cometer mais erros” e “Correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria mais entardeceres”, vão se sucedendo até o triste e melancólico desfecho: “Mas, já viram, tenho oitenta e cinco anos, e sei que estou morrendo”. 

                Depois que li a crônica de Rubem Alves fiquei pensando muito sobre o assunto. Não que aquilo estivesse me dominando a ponto de criar uma neura. Claro que não. Mas o texto vinha à minha mente de forma espontânea e me pus a pensar sobre a minha própria história de vida.

                Quando da nossa mudança do estágio da adolescência para o da juventude, e à medida que a gente vai entendendo o que é viver, surgem de forma natural os nossos sonhos, os nossos projetos e, em função disso, as nossas escolhas.

                Hoje eu chego à conclusão de que tudo (ou quase tudo) aquilo que fiz na minha trajetória até aqui foi totalmente o oposto do que pensava fazer – ou ser – quando ainda estava no meu início de vida pensante. Hoje eu afirmo que dei várias escorregadas e que fui sendo empurrado para aquilo que sou. Bem ou mal, vou vivendo.

                Por exemplo, quando ainda criança meu sonho era ser motorista de ônibus ou de caminhão. Depois, já na fase de transição da adolescência para a juventude, sonhava em ser músico, mesmo não tendo a menor formação musical. Lembro-me de que detestava as aulas de música no antigo curso ginasial. Não me tornei uma coisa e nem outra. Como músico curioso, o instrumento com o qual me entendi bem foi a bateria e alguns outros instrumentos de percussão, tanto que cheguei a desfilar em escolas de samba tocando tamborim. E, ainda na época da bossa nova, lá pelos meados da década de sessenta, cheguei a formar um trio composto por piano, violão e bateria. Além de algumas apresentações culturais, chegamos a tocar em alguns bailes. Como reforço, quatro amigas nos ajudavam nos vocais e ficava um negócio até muito bacana. Agora, como motorista de ônibus ou caminhão, jamais dirigi um bichão desses. Tenho esse sonho até hoje tanto que já escrevi um texto sobre isso, homenageando os profissionais do volante. Ainda na juventude cheguei a pensar em estudar medicina, mas desisti logo. Hoje, acredito que poderia ter me tornado um bom médico.

                Não conheço nenhum músico e nenhum motorista profissional que tenha uma vida confortável e despreocupada no que diz respeito à parte financeira. Em compensação, conheço vários deles que são extremamente felizes com o que fazem. E não vejo necessidade de explicar o porquê eles são assim, tão felizes. 

                A vida seguiu, eu segui junto com ela. Fui trabalhar na indústria siderúrgica e depois na indústria química, tive bons empregos, estudei, aprendi e ensinei muito dentro do ramo em que fui cair; consegui uma boa estabilidade e tenho certa alegria por tudo aquilo que ainda sou.

                Descobri um pouco tarde que tenho algum dom para a escrita, apesar de cometer alguns deslizes na gramática. Mas, na língua portuguesa, quem nunca errou não é verdade? E, para essa atividade que agora exerço simplesmente como um hobby e sem fins lucrativos, jamais me preparei. Talvez a minha própria profissão que exige a elaboração de muitos relatórios técnicos tenha sido o meu único preparo para escrever. E transcrevo uma frase de Patativa do Assaré, que Rubem Alves tão bem lembrou em sua crônica: “É melhor escrever errado a coisa certa do que escrever certo a coisa errada”.

                Plantei sementes, tenho amigos, fui sempre e ainda sou um profissional respeitado, faço trabalho voluntário, viajo muito, tenho filhos, e gosto de exercitar o meu lado ainda criança. Falta alguma coisa? Sim, sempre falta, mas, apesar de não me arrepender de nada do que fiz, pois quando fiz achei que era o certo,se eu pudesse viver de novo a minha vida, certamente faria algumas coisas de forma, digamos... um pouco diferente.

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