CANTORIA DE UMA NOITE DE VERÃO

Parafraseando Elis Regina, nada me dá mais prazer que cantar...

Outro dia eu estava meio jururu, não me dava conta que fazia tempo que não cantava fora dos domínios do meu banheiro. Mas de repente, chegou um convite por telefone, era para eu ir à casa da irmã de uma amiga, onde haveria uma reunião, coisa simples, com umas coisinhas gostosas para comer, e quem sabe, um poderia sair um Chopin do velho piano. Vejam bem: um Chopin, não um chopinho. Para minha alegria, pois honestamente curto mais Chopin que um chopinho.

Não me fiz de rogado, peguei um bom vinho português na adega, e com minha esposa a tiracolo, às oito e meia em ponto tocava a campainha da casa indicada.

Vencidas as primeiras formalidades, coisas que acontecem quando a gente vai à casa de alguém pela primeira vez, pudemos sentir o calor de uma hospitalidade hoje em dia tão esquecida. Em poucos momentos, era como se sempre houvéramos freqüentado aquela casa.

Primeiras taças de vinho servidas, conversa gostosa, aperitivos na mesa. E logo, todos estavam perfeitamente à vontade. Em seguida, um cuscuz dos deuses, daqueles que dá vontade de comer inteiro, e uma torta de frango divina. Se houve mais alguma iguaria, não vi, pois esses dois pratos fizeram a minha alegria!

Mais vinho, mais conversa gostosa...

De repente, a sobremesa! Eu, que sou doceiro, formigão mesmo, tive que desculpar-me: estamos na Quaresma, fiz um voto de não comer doce... Azar meu! Perdi o pudim!

Mais vinho, saímos da mesa. Pedi então à dona da casa que se sentasse ao piano e mostrasse o seu Chopin. Mas minha amiga, a que me havia convidado, disse: ela toca e você canta! E cante “Lua branca” da Chiquinha Gonzaga, eu sei que você sabe.

Pronto! Foi dar pirulito a uma criança! Depois de “Lua branca”, engatei logo “El día que me quieras” e sei lá mais quantas outras... Depois, pedi à pianista que tocasse algo, e ela tocou Ernesto Nazaré com perfeição...

A noite avançou, nesse sarau improvisado, até que as partituras se esgotaram, e me pediram que cantasse algo “a capella”. Deve ter sido o vinho, pois nem tive vergonha e mandei ver “Hymne à l’amour” e “Ne me quitte pas”... Aplausos... Meu Deus, onde está a minha vergonha?

Infelizmente, era hora de ir embora... Como Elisa Doolittle cantava “I could have danced all night” em “My Fair Lady”, eu tinha vontade de cantar “I could have sung all night” ao sair daquela casa tão acolhedora. Fomos para casa em estado de graça, gratos e felizes por ter a certeza que vale a pena viver e continuar conhecendo gente especial!

E no fundo do meu coração de cantador, a vontade, já que me aventurara a cantar “a capella”, de ter cantado “Céu da Mouraria”, “A mi manera” e “Plaisir d’amour”!...Vai ser oferecido assim lá não sei onde!

Crônica mínima oferecida às Familias Tristão Costa de Albuquerque e Tristão Costa Comparini.