"Causos do Amaranto" - A História do Burro

Amaranto era um índio grosso que morava em uma casinha dentro de uma grande fazenda de gado e sobrevivia plantando feijão e milho, criando algumas vaquinhas de leite e fazendo alguns serviços esporádicos quando a safra era frustrada. Ele também possuia um burrinho, que como ele dizia era quase da família.

Em uma ocasião, quando houve um período de quase duas semanas de chuva e como o Amaranto não podia semear a terra para plantar, pois estava tudo alagado, ele encontrou uma maneira de arranjar alguns caraminguás (dinheiro) para se sustentar até que a cheia passasse.Com a chuvarada o riacho que cortava a fazenda subiu dois metros de seu nível normal, inclusive derrubando a única ponte que fazia a ligação da fazenda com o município. Aconteceu de uma senhora de idade já avançada estar para morrer e o padre foi chamado para dar a extrema-unção para ela. Como a ponte tinha caído, a única maneira de atravessar o rio era no lombo do burrinho do Amaranto.O padre não estava muito confiante para fazer a travessia no lombo do burro, porque além de o riacho estar cheio e com correnteza, ele era um pouco avantajado no peso e tinha medo de que o burrinho não aguentasse e os dois afundassem. Mas o Amaranto tranquilizou o padre:

-Não se preocupe, vigário! Este burrinho é forte e nada que nem um peixe.

O padre ainda desconfiado se convenceu e subiu no lombo do burrinho que entrou na água e começou a nadar. Já estavam pela metade do caminho quando o burrinho já cansado e em virtude do peso do padre começou a afundar. Aí o padre se apavorou e começou a rezar. Vendo aquilo acontecendo o Amaranto gritou da margem:

-Pelo amor de Deus, seu padre! O senhor pare de rezar, pois este burrinho é muito religioso. Vai que ele invente de lhe acompanhar na reza e se ajoelhe. Aí o senhor já viu.

Mas apesar do cansaço, o burrinho conseguiu vencer a correnteza e chegar ao outro lado com o padre são e salvo.

O padre ficou tão feliz que resolveu comprar o burrinho do Amaranto e assim foi feito.Ele levou o burrinho para o pátio da igreja, onde ele era a atração da criançada que sempre iam lá para passear no seu lombo, pois ele era bem mansinho.

Em uma tarde que o padre tinha saído para fazer umas visitas, o coroinha deixou o portão do pátio aberto e o burrinho saiu para a rua e infelizmente foi atropelado por um caminhão da prefeitura que passava pelo local, vindo a morrer ficando estatelado no meio da rua.

O padre quando chegou ficou consternado, mas precisava tomar providências para tirar o burrinho do meio da rua e enterrá-lo.

Chamou o coroinha e mandou ele na prefeitura falar com o prefeito que era seu inimigo político (nas cidades do interior geralmente os párocos tem grande influência na política local) para que ele desse um jeito de retirar o burrinho da rua, afinal o caminhão era da prefeitura e a responsabilidade cabia a ele, prefeito, em dar um enterro digno para o pobre animal.

O prefeito mandou o coroinha de volta com o seguinte recado:

O padre que cuidasse da remoção e do enterro, pois o burro era de sua propriedade.O padre ouviu o recado e disse que não iria mexer uma palha para tirar o burro dali.

E assim se passaram dois dias. O burro já estava começando a feder e os munícipes foram reclamar com o prefeito que aquilo não podia continuar. Ele tinha que tomar uma atitude. Então ele resolveu ir na igreja falar com o padre:

-O senhor não vai tirar aquele burro da rua e enterrá-lo. O senhor não vê que ele já está fedendo.

E o padre, aproveitando-se do momento, em que o prefeito estava acompanhado de diversos correligionários, puxa-sacos e de possíveis eleitores, não perdeu a opurtunidade e disse:

-É que não costumo encomendar nenhuma alma antes de comunicar aos parentes do ocorrido...