O Estranho Mundo de Luiza

               Não sei se ela caminhava ou simplesmente deslizava pelos caminhos que sua mente criava. Majestosa, ela passava diante de meus olhos, primeiro encantados, depois fascinados, por aquela figura fora dos padrões. Tinha porte de rainha. Vestia-se com esmero. Suas roupas, sempre coloridas, eram confeccionadas por ela. Seus pés estavam sempre vestidos por tamancos de pau, também feitos por ela. 

               Meus olhos não conseguiam desviar-se daquela figura cheia de mistérios e encantos. Seus dedos eram ornamentados por muitos anéis. Unhas impecáveis e sempre vermelhas. Seu colo exibia colares que realçavam o busto acentuado pelos decotes avantajados, mas, estranhamente comportados. 

               Havia naquela mulher algo de luxuria e recato. Seus cabelos eram negros como a noite. Não lembro a cor de seus olhos, mas eles pareciam esconder todos os mistérios da existência. Aquelas janelas não pareciam dispostas a abrirem nenhuma fresta capaz de revelar sua alma.

               Seu nome? Luiza. Luiza Catambilha. Diziam que enlouquecera depois que seu marido levara embora seu único filho; desde então criava um sapo como se fosse a criança desaparecida. Ninguém entrava em sua casa, que ficava no pé do morro de São José, na cidade onde cresci – Almino Afonso. Havia em torno de sua existência um invólucro de mistérios. Perguntas que se multiplicavam. Respostas criadas ao critério das fantasias de cada um. 

               Sua vida, cercada de mistérios e silêncio, enchia de histórias meu imaginário infantil. Gostava de admirar aquela figura bonita e excêntrica. Quando ia para cidade ficava sentada no batente esperando ela passar. Às vezes ela entrava lá no café de vovó. Chegava silenciosa tomava o café que lhe era oferecido e saia sem pronunciar uma palavra, mas havia um mundo de discursos em seus olhos que seus lábios não pronunciavam. Eu tinha medo dela, mas estranhamente era atraída por seu olhar. 

               O que mais admirava nela eram seus tamancos. Criei o hábito de fazer tamancos, volta e meia estava a cortar paus para fazer tamancos, logo ganhei o apelido de Luiza Catambilha. Mas, eu não conseguia andar com sua elegância, sua desenvoltura e sempre desabava do salto. Ela tinha charme natural. Um glamour que não se aprende, não se copia. 

               Nunca mais vi Luzia. Não soube mais dela. Sei apenas que ela foi a primeira mulher que quis imitar. Seu mundo me parecia tão grande, tão fascinante e atraente. Acho que aprendi com ela a gostar de saltos altos. Obrigada Luiza. Sua “loucura” me ensinou muito sobre a “lucidez”.


Ângela M Rodrigues O P Gurgel
Enviado por Ângela M Rodrigues O P Gurgel em 21/03/2010
Reeditado em 21/03/2010
Código do texto: T2151054
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