"O HOMEM MAIS BONITO DA CIDADE"

Hoje, bem de manhãzinha, cruzei com ele na rua: o homem mais bonito da cidade. Herdou o título num concurso de beleza masculina uma década que não me lembro exatamente qual. De quem foi a ideia? Também não sei, só sei que tinha muito disso. “Rainha dos estudantes”, “Rainha da primavera”, “Miss piscina” (nossa, cada uma!) E para completar, “O homem mais bonito da cidade”...

Dizem que ele era bonito mesmo! A referência era o ator global, o Toni Ramos. Por que digo “dizem”? Não, não é porque eu não o conhecesse! Conhecia, e muito bem. Aliás, quem não o conhecia, na cidade tão pequena? O fato é que a beleza física, aparente, pra mim, nunca fez muito sentido. Nunca sei dizer se alguém é bonito ou não. Sou mais pelos pensares, pelos dizeres, pelos fazeres, nunca pelos “pareceres”. Sou diferente da grande maioria? Talvez, mas o certo é que nunca tive, por exemplo, um ídolo que me fizesse suspirar por ser bonito (graças a Deus!)...

Então ele era o delírio da moçada. As meninas do colégio viviam aos “ais” ao simples toque de seu nome. Amores platônicos, o sonho de consumo, a vida por um olharzinho dele que fosse. Namoradas aos montes. Quem ele quisesse, aos seus pés. E quem não era doida por uma chance com ele? Todas, lógico! Embora eu nunca tenha alcançado a graça de entender isso...

A noite de escolha do “O homem mais bonito da cidade” foi o que chamo de uma noite apoteótica, ainda que inútil, visto que não haveria surpresas. Bastasse terem enviado ao rapaz, a faixa e a coroa, já de início, e tudo estaria resolvido. Mas cadê a graça? Não poderiam se furtar ao momento glorioso de vê-lo subindo ao palco sob a chuva de aplausos e a histeria da mulherada: “Já ganhou! Já ganhou! Já ganhou!” Assim ouvi contarem no dia seguinte, porque é claro que eu não estava lá...

Tantos anos se vão! A cidade cresceu, tem mais o que pensar, e coisas desse tipo não existem mais por aqui. Hoje, “O homem mais bonito da cidade” passou anonimamente por mim. Está meio obeso, meio lento, meio grisalho... Somos meio que vizinhos. Sei que é um marido tranquilo, um pai amoroso, um avô extremado. Vejo-o atravessando a rua com seu andar meio ausente. Curiosamente procuro nele os traços de Toni Ramos. Não encontro nenhum... Aonde será que foram parar? Hoje, talvez ele tenha a beleza que admiro...

MARINA ALVES
Enviado por MARINA ALVES em 23/03/2010
Reeditado em 04/05/2010
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