A GRANDE CIDADE NA UTI

     Sobre um leito da UTI do planeta Terra, a Grande Cidade agoniza, tenta desesperadamente prolongar os seus dias. Padece de múltiplas enfermidades que afetam todos os seus órgãos.
     Picada pelo mosquito da dengue e vitimada pela leptospirose dos ratos. Apresenta-se debilitada e incapaz de reagir contra os agentes agressores. Os olhos vermelhos – inflamados pela poluição do ar – e um forte zumbido nos ouvidos – causado pelo excesso de decibéis – dificultam a percepção do mundo em sua volta. O seu sistema osteomuscular apresenta-se fraco pela erosão e pelo assoreamento dos rios, levando a deslizamentos, quedas de prédios e soterramentos. Envenenada por agrotóxicos e corantes, bebendo água com coliformes fecais e, muitas vezes, retirando do lixo a sua alimentação, apresenta náuseas, vômitos e diarréia. As favelas, células cancerosas que surgiram em decorrência de sucessivas mutações provenientes da miséria e das desigualdades sociais, multiplicam-se desordenadamente em grande velocidade.
     A insuficiência respiratória causada pela poluição do ar, principalmente pelo dióxido de carbono dos escapamentos dos veículos e das indústrias, agrava mais ainda o quadro clínico da Grande Cidade. A ação tromboembólica dos automóveis ocasiona o colapso do sistema circulatório e ameaça o surgimento do temível enfarte, com engarrafamentos e parada do coração da cidade. A defesa imunológica baixa não é capaz de deter a violência urbana e o tráfico de entorpecentes, que proliferam de forma assustadora. Apresenta ainda amnésia para princípios éticos e para o seu significado histórico e cultural. O estresse crônico e a possibilidade iminente de convulsões sociais são fatores que preocupam e que podem levar ao coma profundo.
     A recuperação da Grande Cidade é dificultada, em parte, por deficiências da UTI do planeta Terra. Os respiradores encontram-se danificados. Foram comprometidos pela destruição das florestas e pela poluição do ar. Sem a fraternidade entre os povos, que é a sua energia propulsora, o ressuscitador encontra-se impossibilitado de funcionar de forma eficiente. O prognóstico é sombrio. A paciente é rebelde e, além de não cumprir as orientações do seu médico, faz pouco caso dele, chegando a agredi-lo. Apesar de tudo, mesmo cumprindo uma injusta escala de plantão permanente, o médico não a abandona e está sempre instituindo novas medidas terapêuticas. Afinal de contas, somente Ele poderá salvà-la, pois Ele é o Grande Médico do Universo: Deus.