Infância perdida

Por três vezes, tornei-me pai. Transcorridos três anos de casado, já embalava os berços de um rapazinho e de duas mocinhas que eu e minha adorável consorte trouxemos ao mundo.

Gerei o primeiro filho aos vinte e três anos; minha mulher concebeu-o aos vinte. Nossa família foi constituída sob elevado amor fraternal. Éramos pobres; eu, funcionário do Banco do Brasil; minha esposa, doméstica, dedicada aos cuidados das crianças e da casa, enquanto não decidiu voltar aos estudos para tornar-se médica.

O tempo me concedeu quatro netinhos e Deus ajudou-me a criá-los e a educá-los sob a égide de Sua palavra. A primeira neta hoje faz engenharia elétrica na Universidade de Brasília, a UNB. Aos dezoito aninhos, pensa em tornar-se cientista em área de alta tecnologia; os demais rebentos, outra mocinha e dois rapazes, ainda crianças, são a alegria da família. Essa herança me foi concedida por Deus, para confortar-me na velhice que se encaminha para o ocaso.

Sempre tive por objetivo, proporcionar a filhos e netos uma infância saudável, desfrutada prazerosamente, com boa educação, amor filial, correção disciplinar, respeito aos mais velhos e às autoridades constituídas. O amor ao próximo tornou-se o principal fundamento da educação que lhes transmiti, baseado nos Sagrados Mandamentos.

Assim, penso a família, uma instituição divina. Ao concebê-la nos moldes acima, lembro o cuidado a ser dispensado aos pequeninos, mundo afora. A Convenção sobre os Direitos da Criança é taxativa: “A infância tem direito a cuidados e assistência especiais”.

Não é o que vemos, infelizmente!

Relatório da UNICEF estima que 247 milhões de crianças, no mundo, são privadas de liberdade, contidas em sua inocência angelical, impedidas de brincar e obrigadas a trabalhar. E mais: 180 milhões, correspondendo a 73% desse número assustador, trabalham precária e perigosamente sob diversas formas: em minas ou utilizando máquinas capazes de lhes trazer prejuízos à saúde e ao seu vulnerável e frágil corpo.

E o pior, caro leitor: seis milhões de crianças trabalham sob regime de escravidão. E se não bastasse o horror, pasmem, dois milhões são forçadas a se prostituirem.

Uma vergonha!

Um insuportável descaso!

Uma agressão ao nosso futuro!

Ao sabermos de meninos e meninas de 4 a 17 anos, privados da educação, vítimados por maus-tratos físicos e psicológicos, a revolta nos acomete sem nos conceder um atenuante sequer.

Onde estão o poder público, as ONGs ricamente remuneradas com o dinheiro do contribuinte, as autoridades judiciais, os pais e parentes que não se dão conta do mal cometido contra esses inocentes, incapazes de se defender e, sobretudo, necessitados de amor?

O amor constrói, é benigno e fortalece as instituições.

A família clama por esse fortalecimento.

Amar, pois, é preciso!

É de se concluir: a infância está cada vez mais próxima da extinção. Os pequeninos abandonam os estudos para se dedicarem ao trabalho, cuja remuneração ajudará aos pais nas despesas domésticas. As brincadeiras estão longe de suas agendas lúdicas. A televisão, a Internet, os jogos esportivos e os shows de concorrida frequência afastam a criança do seu estilo de vida infantil, tornando-a adulta precocemente. Meninas de dez e doze anos já rebolam os quadris ao som de maliciosas melodias. E que melodias! Crianças nessa idade praticam sexo prematuramente, submetendo-se aos desejos libidinosos de adultos pedófilos, irresponsáveis e criminosos.

A infância poderá, mesmo, estar perdida. É necessário que nós pais, avós, parentes ou membros da sociedade resgatemos as crianças da exploração física e sexual, da impiedade e da perdição que grassam nesse mundo incrédulo, falto de moralidade, indecente e libertino.

Já ouvi a expressão: “nem tudo está perdido”!

Quisera Deus, em sua infinita misericórdia, confirmar essa máxima. Talvez o Senhor, por ser benevolente, resgate a infância da extinção que se prenuncia.

Façamos por onde libertar a infância.

Não a deixe perder-se!