DESABAFO

Não sabia como é complicado precisar do serviço público de saúde.

Hoje precisei de atendimento médico e achei que seria mais rápido se fosse ao pronto socorro municipal que fica próximo ao meu trabalho ao invés de recorrer ao convênio. No final não sabia se eu precisava de socorro pelo mal estar físico ou pela má organização e descaso de que fui vítima.

Chegando lá havia uma fila e pensei comigo mesma, deve ser aqui mesmo e já me enfiei nela meio insegura sem saber se estava enfrentando uma fila à toa. Perguntei para o senhor na minha frente se ele sabia para que era aquela fila e ele respondeu que também não sabia. Brasileiro é assim, não pode ver fila que já vai entrando.

Fui então encaminhada para o atendimento com o clínico geral, um senhor de uns 55 anos, seco e mal humorado que mal olhou para minha cara, me examinou a jato e me mandou tomar dipirona na veia (estava com febre) e tirar um raio x dos seios da face. Ele me entregou duas fichas, sai então no corredor meio perdida sem saber aonde ir ou o que fazer.

Perguntei então a uma enfermeira que ia passando e ela me mandou para a última salinha do corredor. Lá coloquei as fichas numa caixinha na porta (isso depois de tomar uma bronca por estar parada na porta com as fichas na mão) e aguardei.

Fui então chamada para tomar dipirona na veia. A enfermeira enfiou sem dó nem piedade aquela agulha imensa em minha veia e o troço começou a arder tanto que eu tive que falar. Ela então me perguntou se eu estava com febre. Claro que eu estava com febre, quem toma dipirona se não está com febre? Será que ela não leu na minha ficha que eu estava com 38 graus? Comecei a ficar revoltada ...

Ela me disse que quando a pessoa está com febre, a veia estoura e então foi para uma nova picada, dessa vez na veia da mão. Sai de lá com dois enormes esparadrapos grudados e de novo sem saber o que fazer para tirar o raio x. Perguntei novamente para a enfermeira que me mandou voltar ao guichê da entrada. Esperei então por volta de uma hora, quando finalmente chamaram. Logo a radiografia ficou pronta e fiquei plantada novamente no meio do corredor sem saber onde levar. – enfermeira! Eu tinha que levar o raio x com minha ficha para o médico analisar, mas cadê minha ficha? Minha ficha havia sumido. Voltei ao guichê da entrada e a moça queria saber o que eu tinha feito com minha ficha.

- Mas aqui quem cuida das fichas é o paciente? Moça, eu tinha duas fichas, uma pequena e uma grande.

- Não, a pequena é do raio x. - Disse a atendente do guichê.

- Certo, então onde está a grande?

Procuraram num calhamaço imenso de fichas e nada de encontrarem a minha, quando finalmente eu me lembrei que eu havia entregado na salinha onde me aplicaram a dipirona.

- Ah, por que você não falou antes? – Disse a moça do guichê.

Puts, mais uma bronca. Fui então buscar a ficha e, pela lógica da coisa, imaginei que era para enfiar na caixinha da porta do médico junto com o raio x.

Depois de esperar o médico chamar todos os pacientes, finalmente ele saiu da sala e viu a minha ficha.

Mais bronca! Não era para colocar a ficha lá, pois ele considerava esse sistema arcaico e não podia ficar saindo toda hora para pegar as fichas do lado de fora da sala dele. - Minha culpa, minha tão grande culpa!

Finalmente recebi um diagnóstico de sinusite. Sai do consultório com uma receita de antibiótico e já estava no carro, quando me lembrei que havia esquecido de pedir o atestado médico.

Voltei lá, encontrei o médico no corredor e pedi lá mesmo. Mais bronca!

- A senhora não vê que estou fora de meu consultório? Faça o favor de aguardar-me na porta.

Lá fui eu obedientemente, com muita vontade de dizer poucas e boas a esse médico metido a besta.

Pobre, além de já ter a carga de ser pobre, também tem que ser mal tratado e desrespeitado?

Fiquei revoltada sim, com o descaso e falta de organização no sistema de saúde pública. Isso porque eu estava apenas com mal estar de febre e ainda não estava morrendo. Imagine alguém que estivesse num estado pior.

Fico indignada, pois todos pagam tantos impostos e os menos afortunados são tratados sem a menor compaixão.

Não temos culpa se o pronto socorro tem muitos atendimentos, se eles estão de saco cheio de tanta gente. Se o médico tem que atender inúmeras consultas por dia. Se ele é infeliz com a profissão que escolheu, se ele ganha um salário de fome, etc.

O que deve ser levado em consideração, é que o pobre já sofre tanto com tantas outras coisas e merecia receber o mínimo de respeito e dignidade nas horas de dor.

E para finalizar, o diagnóstico estava errado, estou com DENGUE.

Fica aqui o meu desabafo e a minha pergunta: Será que isso algum dia vai mudar? Será que algum dia haverá um mundo melhor, onde se privilegiará o ser e não o ter?

Luazul
Enviado por Luazul em 16/04/2010
Reeditado em 16/04/2010
Código do texto: T2201022
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