Que pena!

Meu sonho!!!!!!

Um travesseiro de penas de ganso! Meu sonho!!!

Que delícia! Diziam que era muito caro, mas achei não! Ou será que já tô podendo? Tô numa podeção, ultimamente!!!

Comprei! Corri lá e comprei meu sonho!!! Forro branquinho, textura maciinha! Isso mesmo que eu queria! Primeira noite, huuuuummmm! Quanta frescura!!! Cara, tô dormindo em travesseiro de pena de ganso, meu!!!!!

P*#%$&!!!!!! O MELECA, meu cachorro, encontrou a porta do meu quarto aberta! Que meleca, sô! E encontrou mais o quê???? Meu sonho em cima da minha cama!!!! E acabou fazendo o quê????? Meleca nele!!!!!

Já imaginaram o que deu, né? O Meleca melecou meu sonho! E aí? E agora? Fazer o quê? Máquina de lavar nele! Não no Meleca, mas no meu sonho!

Tá bom, nem pensa em me dizer agora que eu não podia ter feito isso, agora não vale, já fiz, fiz com força, com vontade, com a máxima rapidez pra eu ter meu sonho de volta!

Então! Enfiei meu sonho dentro da Brastemp, rodou pra lá, rodou pra cá. Fiquei feliz, coloquei Confort, vai ficar maciinho de novo! E cheirosinho!

O Meleca correu que correu pra debaixo da mesa. (Eu devia estar brava mesmo, ele quase não faz isso!) até parece que adiantou, até parece que isso vai trazer meu sonho de volta.

Fazer o quê? (De novo!!) Tá bom, vamos pensar, vamos pensar!! Jogar meu fofinho fora? De jeito nenhum! Afinal era meu sonho. Pendurá-lo no varal? Ixi! Já ouvi falar que alguém deixou secando assim, semanas a fio e ficou uma catinga que ninguém aguentava mais! Só me restava uma alternativa: abrir meu sonho, depenar meu sonho, com todo carinho, tirar de suas entranhas todo o conteúdo e espalhar sobre o alvo lençol no quintal ao sol!

Que boa ideia essa! Eu sou demais!! Fiz a operação (antes, porém, deixei Meleca no seu quartinho, não queria ver mais estragos!), com uma minúcia nunca antes imaginada, com um cuidado de neurocirurgião. As plumas, antes tão leves, tão alvas, tão macias, agora estavam lá, um retrato em branco e preto, borrado, que nem galinha em dia de chuva, que nem pintinho saído do ovo. Mas eu não podia desanimar! Não podia abandonar meu sonho assim, tão fácil!

As penas foram secando, que lindas! As penas foram ficando leves, cada vez mais leves! O vento veio, as penas, cada vez mais leves só tinham um destino agora: o mais alto dos céus!!!!!

MELECA!!!!! Não, não tô xingando mais o meu cachorro. Desde o gritão que dei no fatídico dia, ele passa por mim com o rabinho entre as pernas, tentando encontrar minha mão para um possível carinho. Eu tô aqui, sentada, olhando as penas ganharem vida própria alçando voos cada vez mais longínquos em direção ao infinito, ao alto e além!

Que pena! Que penas! Peguei uma de volta, duas, três, dez! Mas, no fim, desisti. Eu tive de desistir. Cansei. É duro lutar contra aquele que quer a liberdade, o azul do céu, a ânsia de lugares tão longes e inesperados. Quem sou eu pra segurar esse povo, né?

Que pena! Meu sonho voou! Alcançou o infinito e se foi. Vai, meu sonho, vai, voa até onde a vista não mais alcança e me deixa aqui, me deixa com o MELECA! Mijado pelo Meleca e, por uma falta de sensatez minha, se desfez nas nuvens de algodão. Vai, meu sonho, vai!

Que pena!