Sob o Céu de Brasília

SOB O CÉU DE BRASÍLIA

Maria Teoro Ângelo

Depois de quase três décadas fui rever Brasília. As lembranças que eu tinha da Capital, além do que tinha visto rapidamente em meados dos anos 70 e do que se vê na mídia diariamente, eram as imagens de sua inauguração, do que representava naquela época, da esperança, dos olhos no futuro, da imensidão do planalto central, das edições extras de jornais e revistas apregoando um progresso sem limite. Eu, menina estudante, colecionava tudo isso e acreditava que para sermos primeiro mundo era só uma questão de tempo.

Poucos anos atrás me reencontrei com Ela e, então pude vê-la com meus olhos sensíveis e desprovidos de qualquer preconceito. Foi um amor à segunda vista.

Fui de carro para conferir uma espécie de tratado que meu pai havia escrito por volta de 1960, depois de uma viagem que fizera ao planalto, e onde descrevia as mudanças do relevo e da vegetação no caminho desde o norte de São Paulo até o Distrito Federal. Das montanhas de Minas ao cerrado de Goiás com seu verde-escuro sobre os troncos tortuosos das árvores quase anãs. E o imenso, o grandioso planalto central. Plano e alto, lá em cima, bem acima do nível do mar. Foi ali que contemplei o mais lindo nascer do sol brotando de um horizonte longínquo, alargado pela ausência de barreiras num céu cor-de-rosa mesclado de pequeninas nuvens azuladas.

A Cidade possui enormes espaços abertos onde a grama cresce e os caminhos são feitos pela pressão insistente dos passos. Dão a impressão de que há lugar para todo mundo, tão diferente das outras cidades que já conhecia. O cerrado parece invadir a cidade e por todo lado se pode ver resquícios dele nas ruas e nas praças, exemplares deixados de propósito como emblema de uma região. Árvores frutíferas convivem com árvores ornamentais e durante o ano todo os ipês, as paineiras, os ingazeiros, as ameixeiras, mangueiras, jaqueiras e os arbustos se revezam na produção de flores e frutos. Acordo com o canto dos pássaros e me encanto com o casal de joão-de-barro construindo sua casa. Eternizo com fotos as paineiras e os ipês lançando ao solo suas frágeis flores e elevando seus galhos coloridos ao azul mais azul do enorme céu que paira sobre mim.

A lua cheia se desdobra em duas: uma no céu, outra no lago. E há ainda outra que me espia pela janela do meu quarto de dormir. Tanto o sol quanto a lua parecem nascer mais cedo e morrer mais tarde porque podemos enxergar seu ciclo em toda a sua plenitude.

As construções que mudaram paradigmas, as siglas que deixam tonto quem vem de fora, o novo jeito de cidade com quadras em vez de ruas, o verde abundante, os canteiros de flores vistosas, o calor, o vento, o vermelho deslumbrante da terra desnuda, a sensação de que se pode enxergar ou ir bem longe servem como pano de fundo para o principal motivo dessa minha paixão: as pessoas tão generosas, tão disponíveis, tão dispostas a me aceitar. As amizades sinceras, as histórias de vida, o aceno que traduzo como ser querida, o encontro de uma paulista com pedaços de todo o Brasil roubaram a minha alma. É para lá que eu quero sempre voltar.

21/abril/2010