A lista de Oswaldo

Há pouco mais de um mês, no ótimo programa “Todo Seu”, apresentado por Ronie Von na TV Gazeta, um trecho de uma longa entrevista com o cantor e compositor Oswaldo Montenegro deve ter feito muita gente repensar a própria existência. Em meio a conversas que variavam entre a vida pessoal e a carreira do músico, Ronie pedia alguma canção, que Oswaldo prontamente atendia, acompanhado apenas de seu violão.

Durante a execução de uma delas – “A Lista” – o apresentador foi ficando ensimesmado a ponto do câmera, que centrava o foco no cantor, desviar a atenção para seus olhos. Ronie Von, que tem como uma de suas características o falar com sinceridade de sua própria história, derramava lágrimas, que foram explicadas posteriormente como o desembocar de uma torrente de lembranças.

Não é para menos. Na canção o compositor de Bandolins, Agonia e Lume de Estrelas propõe o seguinte: “faça uma lista de grandes amigos, quem você mais via dez anos atrás. Quantos você ainda vê todo dia, quantos você já não encontra mais...”. Para os que passaram dos 30 anos e aceitem o desafio de elaborar a tal lista, embalados por uma melodia um tanto melancólica, muito provavelmente constatarão que grandes companheiros do passado ficaram lá mesmo ou se tornaram um telefone, um e-mail na agenda. A vida atribulada, a distância e a falta de tempo são sempre álibes para estes desencontros.

Oswaldo Montenegro continua instigando: “faça uma lista dos sonhos que tinha; quantos você desistiu de sonhar! Quantos amores jurados pra sempre, quantos você conseguiu preservar...”. Os amores do passado devem mesmo ser apenas lembranças (de preferência boas); caso resistam ainda como amores no presente é sinal de que algo continua errado. Quanto aos sonhos, estes precisam ser revistos, pelo menos para se saber se foram realizados, se eram utopias ou se foram relegados por força das circunstâncias.

“Onde você ainda se reconhece: na foto passada ou no espelho de agora? Hoje é do jeito que achou que seria? Quantos amigos você jogou fora?”. Neste trecho da música somos levados a um dos grandes dilemas da fase adulta: a não aceitação de si próprio diante do espelho. Na verdade, nem é uma crise de dimensão física, e sim de reconhecimento de um lado talvez mais leve e feliz, estampado naquela foto de outrora.

“Quantos mistérios que você sondava, quantos você conseguiu entender? Quantos segredos que você guardava, hoje são bobos, ninguém quer saber?”. A lista vai se aprofundando, como que num convite a uma viagem ainda mais existencial. Muitos chegam a certo ponto da vida em que só se preocupam com cifras, bens materiais e com a melhor forma de obtê-los. Sequer sabem mais dos mistérios e segredos que algum dia possam tê-los feito vibrar apenas por estar vivos.

“Quantas mentiras você condenava? Quantas você teve que cometer? Quantos defeitos sanados com o tempo, eram o melhor que havia em você? Quantas canções que você não cantava, hoje assobia pra sobreviver? Quantas pessoas que você amava, hoje acredita que amam você?”. Neste trecho final da música Oswaldo propõe o maior desafio para quem chegou até aqui em sua lista: encontrar em si as incoerências entre discurso e prática; encontrar em si a provável encruzilhada na qual foi obrigado a escolher entre o caminho mais longo e o atalho. Não é assim que a maioria age quando estão em jogo a sobrevivência, as ambições, os ideais de poder e sucesso?

Roberto Darte
Enviado por Roberto Darte em 23/04/2010
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