A pombinha Lili

Esther Ribeiro Gomes

Todas as manhãs ela chega de mansinho, ressabiada, à procura de alimento. Arisca, vai entrando na cozinha devagarinho...

Jogo miolo de pão e ela adora!

De repente chega Ralf, vira-lata atrevido, e ela foge assustada.

Nas árvores do meu jardim pousam bem-te-vis, sabiás, beija-flores que encantam e alegram meus dias. Agora vem também essa linda pombinha que apelidei de Lili.

Não fosse a impertinência do Ralf, ela ficaria mais tempo. É assim que gosto dos pássaros: livres!

Nunca os teria engaiolados, eles nasceram para voar!

Quando a caça era permitida, meu falecido marido, como todo bom italiano, reunia-se com os amigos e organizavam caçadas no interior de São Paulo.

Uma vez por ano, lá iam eles, munidos de espingardas, mochilas e seus inseparáveis cães, numa perua Kombi, rumo a mais uma aventura!

Confesso que não gostava de caçadas.

Para que matar os passarinhos e outros bichinhos inocentes?

Fiquei feliz quando a caça foi proibida!

Mas, voltando à aventura, Dante e seus amigos ficavam hospedados na fazenda de algum conhecido e preparavam a própria comida.

Traziam os suculentos molhos de casa, mas cozinhavam o macarrão na hora. Os italianos são muito exigentes para cozinhar a massa.

Tem que ser ‘al dente’, ou seja, não pode ficar mole, tem que sentir no dente. Ficavam irritados quando viam os colonos da fazenda misturarem a massa com arroz e feijão.

Para eles era um sacrilégio! Então vinham os impropérios: ‘Quelli stronzi, va fan c...’ e outros que ‘soltavam’ com a maior naturalidade...

Um dia, a esposa do caseiro da fazenda ofereceu para eles um almoço ‘a la italiana’.

Meu marido e os outros italianos estavam acostumados com massa fresca feita em casa, molhos divinos, que ficavam horas cozinhando. Então as esposas dos colonos se juntaram para fazer a lauta refeição. Prepararam a massa fresca, como manda a boa cozinha italiana, mas nada de começarem a fazer o molho.

Horas se passaram e nada do molho... Eles se perguntavam: - elas estão tendo um trabalhão para fazer a massa, mas o molho demora horas cozinhando e nem começaram!

Depois de tanto esperar, finalmente o almoço estava pronto. Quando chegaram à mesa, qual a surpresa! Elas abriram uma latinha de extrato de tomate ‘elefante’ (lembram?) e jogaram, sem ao menos esquentar, sobre aquela massa divina!

Fazer o que? Impropérios à parte, comeram sem cerimônia, porque a fome era demais...

Naquele dia, os pobres passarinhos e as pombinhas ‘Lilis’, se livraram de serem comidos!

Depois das caçadas serem proibidas, eles se organizavam para grandes pescarias.

Uma vez por ano iam pescar no Pantanal e traziam Pacus, Dourados e Pintados, que fazíamos na brasa.

Ainda sinto na boca aquelas delícias! Que saudade...

Esther Ribeiro Gomes
Enviado por Esther Ribeiro Gomes em 24/04/2010
Reeditado em 06/05/2010
Código do texto: T2217047