A coxinha de galinha

A coxinha de galinha sobre o meu prato sempre teve suas preferências entre as partes mais saborosas do frango. Uma peça com mais osso do que carne, já serviu para muita reflexão. Desta feita lembrei-me que bem poderia ser um parâmetro para estabelecer-se diferenças entre gerações. Nem sei se esta idéia é original, talvez tenha ouvido alguém comentar sobre o assunto. Mas a peça bem pode ser utilizada para simbolizar estas diferenças. Desta forma então a minha geração, foi aquela em que o filho era obrigado a deixar a coxinha para o pai, embora nem sempre voluntariamente. Numa época de educação rígida onde a sinta cumpria uma função extra, além de simplesmente segurar as calças. Responsável por bundas marcadas em relevo vermelho, que obrigavam nossas mães a carinhosamente aplicar compressas de salmoura para minimizar o estrago.

Meus filhos pertencem a uma geração em que o pai deixa a coxinha para o filho, embora isso possa ser perigoso. Se deixarmos o barco correr, depois pode ser difícil recuperar a autoridade paterna. Não significa voltar ao uso alternativo da sinta. Criei meus filhos com o que chamo de liberdade vigiada. Isto é, saber sempre onde estavam, por que, e o que estavam fazendo. O resultado foi muito bom, pois nunca tive problemas com drogas ou queixas de quem quer que seja. Seguindo esta linha de raciocínio a geração de meus netos, será aquela em que o pai divide a coxinha com o filho. Neste momento, a coxinha que saboreava caiu de volta ao prato. Sobressaltei-me ao lembrar de relatos recentes, de filhos que matam os pais, por dinheiro ou pais que matam filhos, como última e desesperada maneira de livrá-los das drogas e da criminalidade. Será, que ao invés de dividirem a coxinha, não irão digladiar-se pelo saboroso pedaço da penosa? Nós vivemos em uma sociedade que há muito deixou de ser segura e aonde valores vem sendo alterados e substituídos numa velocidade vertiginosa. Mata-se por uma pedra de crack. Os jovens passam horas diante de vídeo games ou programas de computador, onde o tema principal é matar gente, como se isso fosse uma coisa banal. Mata-se para roubar um par de tênis que será trocado por uma pedrinha de crack. O valor da vida compara-se a um objeto qualquer ou alguns quilogramas de arroz ou feijão. Na minha idade, não pretendo mais ter um filho para criar. Já os criei e contabilizo 5 maravilhosos netos. Mas se por uma destas voltas do destino vier a ter algum relacionamento e surgir alguma surpresa, nem sempre podemos evitar que aconteça. Mulher quando decide engravidar, é capaz de todas as artimanhas e geralmente consegue o objetivo. Já passei por isso. Hoje ele tem 24 anos.

Tomarei então uma precaução radical. Eliminar a coxinha do cardápio, pelo menos até que saiba com quem estou lidando.

Lauro Winck
Enviado por Lauro Winck em 29/04/2010
Código do texto: T2226373
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