Manias, meras manias
Não me incomoda ser um maniático. Coleciono e acumulo manias. São tantas, que fica difícil até escolher algumas para comentar aqui. A própria indecisão é uma.
De todas, a mais antiga é a de deixar tudo inacabado. Desde a última Trakinas que morre no pacote, até as tarefas domésticas, como lavar a louça, recolher a roupa. Sempre sobra uma uma peça no varal ou um prato na pia. Já cansei de ler livros até o penúltimo capítulo e depois os devolvi à prateleira. Chego a deixar uma unha por cortar, só para não terminar o serviço. E mesmo meus textos, me parecem sempre inacabados, faltando a frase final.
Não conseguir falar com alguém que esteja a minha esquerda. A não ser que haja alguém à minha direita. Aí sim.Pode ser chamado de transtorno obsessivo compulsivo (TOC), mas prefiro mania. Se estivermos caminhando, você, leitor, e eu, lado a lado, saiba que só haverá diálogo se eu estiver do lado esquerdo. Você à direita. Ou ficarei inquieto, falando de forma confusa e desinteressada. Com educação, pedirei para atravessar à sua frente a fim de me postar à sua esquerda. Preciso ter, sempre, alguém à minha direita.
Não consigo ler ou escrever com relógio de parede por perto. O tic-tac dos ponteiros soa como um sino de igreja. Escovar os dentes com a torneira da pia fechada, é impossível. Anotar alguma coisa na aula? Só por cima das dezenas de listas "top 10" do meu caderno. Na escola, eram as letras de música traduzidas e as escalações de times de futebol. Caderno é para entretenimento.
Ao mesmo tempo em que são nossas maiores particularidades, nossas manias também nos assemelham. Nos reconhecemos facilmente nos hábitos que percebemos nos outros. Ter uma mania em comum é um primeiro passo para gostar de alguém. Pois rende, no mínimo, um bom papo.
Manter as boas manias é tão necessário quanto cultivar boas amizades, ver os bons filmes e ler a boa literatura. Elas estarão conosco até o fim, às vezes com o simples propósito de nos trazer lembranças como “faço assim desde pequeno”, ou “minha mãe sempre achou isso estranho”. As manias nos tornam facilmente identificáveis.