OBSERVADOR

Ela acha que não, mas eu reparo. Reparo quando ela se arruma fazendo combinações com as cores, reparo e a imagino em frente ao espelho, buscando uma maneira de "ficar bonita". Reparo quando ela prende o cabelo com a caneta, na intenção de mostrar sua tatuagem do pescoço, uma fada.

Reparo em suas subjetivas perguntas, querendo, através da minha resposta, fazer analogias às outras perguntas as quais não teve coragem de me fazer. Uma pena, ela não reparou quando abri um sorriso e dei bandeira branca pra ela continuar... Reparo também quando ela morde os lábios na intenção de mostrar o batom novo, quando ela coloca uma blusinha verde quando digo ser esta a minha cor preferida, quando comenta sobre algum filme do Almodóvar ou do Tarantino, ou sobre alguma música do Los Hermanos, apenas pra me agradar.

Mas eu sei que ela também repara...

Repara quando a olho de canto de olho, repara que, em fração de milésimos de segundo, esboço susto ao esbarrar com ela, assim, como de repente... Repara que meu tom de voz é diferente ao falar com ela, que eu gaguejo, tusso, coço a cabeça... ela repara em tudo isso. Repara também que não sei mentir ao simular aquele coincidente esbarrão pelos corredores. Ela repara que estou tremendo de frio, mas meu casaco está ali ao meu lado, dobradinho e perfumado, aguardando- a dizer "tá friozinho aqui, né?". Ela nem estava com frio, mas faz o comentário e repara no brilho dos meus olhos ao entregá-la o casaco. Não imaginava que ela fosse reparar nisso não...

Adoro saber que ela repara em mim, e acredito que ela goste quando reparo nela também. Mas, sinceramente, não reparamos em tudo não. Não reparamos quando o outro chega por trás, coloca a mão em nossos olhos e faz a pergunta mais boba do mundo: "Adivinha quem é?" Ela não reparou quando coloquei aquela rosa sobre sua mesa, e eu também não reparei que ela já tinha comprado as entradas do cinema assim que comentei querer assistir àquele filme...

Existem coisas que não podemos reparar. Ainda bem... se reparassemos em tudo, não haveria acaso, não haveria surpresa, não haveria magia... e o amor seria vendido na padaria da sua esquina, a preço de pãozinho francês.

Não repararmos em tudo é o motivo de o amor não necessitar de reparos...

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