Nos dias em que a Dita era Dura

Funcionário publico exemplar, nunca faltou ao expediente, doze por trinta e seis, assim era seu turno.

Chegava pela manhã cedo, trazia pão quentinho, sua esposa o aguardava, tomavam a primeira refeição do dia sempre juntos. Sentavam e ele fazia a a segunda coisa na vida que mais gostava depois de seu trabalho, falar sobre tudo o que tinha feito durante o expediente, quem sabe um dia escreveria um livro.

Esta penúltima madrugada não fora nada fácil, alguns estudantes filhinhos de papai, foram presos, como todos, vagabundos e folgados.

Na delegacia enchemos todos de porradas, quando revistamos, se não vai acreditar, dentro da bolsa de uns dois haviam livros comunistas de Jorge Amado e Marx. O Dr. Mandou prender na hora. Deveriam ser subversivos com certeza.

Levamos para o confessionário, só ficaram falando de direito disto, direito daquilo, como se comunista e subversivo fossem humanos.

Mandamos tirar roupa, não queriam tirar não, só depois de alguns sopapos é que resolveram obedecer.

Demos banho de água gelada, borrachadas, palmatória, e mesmo assim diziam não terem feito nada de errado

Aí, graças a Deus, não tivemos outro jeito se não pendurar todo mundo. Já contei como é, mandamos sentar no chão, dobrar os joelhos, colocar as duas mãos em volta, amarramos as mãos pelos pulsos, enfiamos um cano de ferro entre as mãos e os joelhos, levantamos e colocamos entre duas cadeiras, ficam parecendo carne pendurada no açougue.

Ficam com a bunda virada pro céu e cabeça pro chão.

Tem que ter técnica, conhecimento. Esperamos o sangue descer para a cabeça, as pernas adormecem, só aí começamos a dar palmatórias e bor rachadas. Jogamos água pelo nariz e boca, dando a sensação de afogamento, enfiamos o cassetete aonde der e por fim, o melhor amarramos um fio num dos dedos dos pés ou das mãos, e com o outro fio colocamos nas partes intimas, olhos, boca, aonde quisermos, dando choques a vontade. É tão divertido que tem hora que choramos de tanto rir.

Tem alguns que são nojentos, durante os interrogatórios chegam a fazer suas necessidades, como se fossem animais, mas nós os fazemos limpar, urinar é comum.

Um dos estudantes de antes de ontem, abortou, ainda bem, é menos um comunistasinho para a história.

Bom o plantão foi puxado, estou cansado, vou dormir.

Isidoro Machado
Enviado por Isidoro Machado em 22/05/2010
Reeditado em 09/06/2010
Código do texto: T2272757
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