SURDEZ

Num final de semana desses perdi praticamente toda a audição da orelha direita. Julguei ser devido a um tampão do tipo que os nadadores usam utilizado quando estou trabalhando com as máquinas na marcenaria.

Se você não tem nenhuma intimidade com o assunto, a coisa do ruído é braba. Todas aquelas máquinas berram decibéis à vontade. Uma serra esquadrejadeira, um desempeno ou desengrossadeira deixa qualquer audição com um estresse e uma zoeira de botar inveja.

Então eu comprei um abafador de ruídos daqueles parecidos com fones. Muito bom para atenuar a barulhada, mas imagine, eu penduro nas minhas orelhas um par de óculos, uma máscara tipo cirúrgica para pó, o boné para proteger os cabelos também toca ali e por cima disso tudo aquelas cuias enormes. Era muita coisa para as minhas só duas orelhas e por isso decidi usar daqueles que são introduzidos dentro do canal auditivo.

Por eu não saber sintetizar nada, disse tudo isto até aqui para justificar a minha primeira impressão de que foram os tampões que empurraram o pó lá para dentro, me causando aquela sensação horrível de não estar escutando e tendo a impressão de que aquele lado estava fora de mim. Coisa estranha! Depois fiquei sabendo não ter sido nada disto.

Isto ocorreu num momento e num lugar onde eu não podia encontrar alguém para fazer alguma coisa e nem havia mesmo essa urgência toda. Chegando aqui em casa, comentei com a Isa. Mas, não tem jeito; eu não consigo aprender! Imagine o que aconteceu? Lascou uma receita para cima de mim. Não só sugeriu como logo, logo desceu à cozinha e de lá voltou com um litro de álcool, algodão... Tudo prontinho para me socorrer à sua maneira.

Indaguei o que ia fazer. Disse-me que quando alguém tem ouvido entupido, bota álcool que melhora. E falou com uma autoridade de dar inveja. Ela pensa que eu não sei nada de medicina. Isso aí somente se aplica quando o “entupimento” é provocado por água. Meu caso não tinha nada a ver, mas também não ia fazer nenhum mal. E se ela estivesse com a razão? Tem tanto chute em medicina... Bem, deixa para lá!

E foi logo deitando ordens. Mandou-me ficar deitado de lado e tacou álcool para dentro da minha orelha. Aquilo fez um barulho danado e aconteceu o inevitável: fiquei surdo de tudo; não escutava mais nada mesmo. Olhava para a TV com a outra orelha tapada e somente via os caras mexerem a boca e nem um som. Nadinha!

Ela agora já estava sentada na cama, tronco recostado e mexendo com alguma costura. Não consegue ficar quieta nem para ver TV. Disse-lhe que a coisa ficara pior do que antes. Pensei que ela fosse ficar preocupada, mas não deu à mínima e ainda me sugeriu... Sugeriu nada, ordenou:

- Dê uns pulos!

- O quê?

- É! Dê uns pulos, assim ó! E fez aquele gesto de encolher os ombros algumas vezes acompanhados com balanços e elevações do tronco.

O que eu também fiquei mais decepcionado com tudo isso é da minha mulher julgar que eu não sei o que é pular, dar pulos! Tinha de me ensinar! Será que ela está imaginando que eu estou com Alzheimer? E ela rindo; desmanchando de rir. Aproveitando bem da minha desdita.

Se você teve coragem de ler isso até aqui deve estar muito interessado, no final, se eu dei os pulos. Dei! Levantei da cama com todo aquele frio e dei uns dois ou três saltinhos até cair em mim e me sentir encarnado de um reles babaca e do maior dos babões deste mundão de Deus!

E ela continuava gargalhando. Naquela altura, já tinha jogado pro lado os panos, agulhas, tudo mais e ria a valer. Riu tanto, tanto que acabou com um tremendo soluço.

Bem feito!

Dbadini
Enviado por Dbadini em 25/05/2010
Código do texto: T2279209