MORTE NO CANTEIRO CENTRAL

MORTE NO CANTEIRO CENTRAL

Maria Teoro Ângelo

Aconteceu logo ali, a um metro de nossas casas, a um palmo de nossos olhos. O povo correu, juntou muita gente. Uns choravam. Quem vinha chegando se assustava ao saber do fato. O corpo da moça jazia sob as rodas do caminhão.

Aproximei-me a uma distância segura, resguardando a certeza de que eu não veria nada. A agitação incomum tomou conta das imediações. A aparente indiferença de algumas pessoas não era insensibilidade, era o alívio por não terem sido elas.

Em casos assim ouvem-se muitos comentários: quem foi o culpado, os detalhes do ocorrido. Culparam a violência do trânsito, a falta de cuidado dos pedestres. Mas a violência que de fato houve, foi a violência do ato de viver, a violência do destino que arma ciladas inevitáveis.

A conjunção de muitas coincidências começou a se organizar lá atrás como um exército que marcha implacável sobre a vítima para um desfecho fatal. Todos os envolvidos foram monitorados por uma força invisível em cada segundo que antecedeu a tragédia. É a força do imponderável, do imprevisível que ninguém conseguiu evitar.

A moça, a princípio anônima, foi pega de surpresa. Um descuido, uma fatalidade e tudo acabou. Quantos sonhos ficaram por realizar? De onde ela vinha? O que teria deixado no rastro desse caminho tão bruscamente interrompido? Para onde ia? O que a esperava? São perguntas que só ela poderia responder.

Temos então, mais uma vez , a certeza da finitude da vida, da precariedade de nossos corpos, tão rudemente ilustrada na cena que vimos e que não estávamos acostumados a ver assim tão perto, tão real, tão cruel.

Vale viver melhor a vida que ainda temos, afastando os perigos, quando isso depende de nós. Vale redobrarmos o cuidado com as surpresas que nos espreitam em cada esquina e que, não obstante a carga fatal que carregam, podem, em algum momento, ser evitadas.