Eterna espera

Só aquela música já entorpecia. Não havia letra alguma, era só uma batida ensurdecedora que impedia-lhe de ficar parada... fazia o coração bombear o sangue aceleradamente. As luzes transformavam o ambiente escuro em algo giratório, e modificava a feição daqueles que se aproximavam. Todos vinham me cumprimentar, me dizer o quanto estavam surpresos por eu estar ali. Eu realmente não costumava freqüentar tais lugares. Muitos conhecidos falaram comigo, menos aquele ao qual foi o motivo da minha vinda. Menos aquele que foi capaz de mudar meus hábitos. Menos o único por quem eu tive coragem de enfrentar quem era contra o que eu sentia... até mesmo eu mesma. Tinha medo de sentir algo. Tive medo de me envolver. Mas os clichês diziam que se arrepender por algo feito era mais orgulhoso do que por algo que não se teve coragem de fazer. Segui...

Estava insegura por não saber o que aconteceria. Deixaria o coração guiar. Mandou: esperei. Senti-me um tanto perdida no meio de tanta gente, que não se intimidava em empurrar, em pisotear. Parei. Precisava me acalmar. O novo trazia nervosismo. Pedi o mais engraçado da tabela. O gole queimou por dentro e não agradou o paladar, mas o bolso incentivava o consumo. Acalmou, relaxou. Podia esperar por ele até o fim das danças, até o último funcionário ir embora, até o dia amanhecer. Mas as pernas não obedeciam mais. O relógio biológico incomodava, indicando que estava desacostumado a tais horários. Olhei mais uma vez em volta e ele estava lá, sozinho e compenetrado na batida do som. Senti meu rosto abrir-se num sorriso amarelado, e a vista embaçou, mas sem conseguir derramar a lágrima.

Ao aproximar-me da saída, pude notar fina garoa no teto. O início de noite anunciava tempo nublado com as nuvens negras, porém reservou a chuva para a madrugada. A distância já não mais importava, e as sandálias na mão faziam a pele sentir o asfalto empoeirado. A garoa começou a lavar a poeira, bem como a desmanchar a maquiagem rapidamente antes do choro. E o sorriso acompanhava. E o vento esfriava. Ao longe ainda podia ouvir as batidas da música, confundidas com as que permaneceram na minha mente, combinadas com as buzinas dos carros que os faróis traziam para mais perto. O sangue circulava alcoolizado, como que fosse a única coisa ainda viva a esquentar o corpo cansado, porém não era suficiente para controlar os outros sentidos, que ainda respondiam por si. E o tempo passava despercebido ao voar.

Eu achava que podia espera-lo até o amanhecer. Me sentia bem. De tanto andar, as pernas amoleceram, como se não mais existissem... estavam adormecidas. A luz do sol trazia-me conforto, vindo do horizonte. Mas foi diferente. Não nasceu aos poucos, por detrás da montanha, como de costume. Veio de uma vez só, através de um clarão estridente que, tomando conta de mim, foi capaz de me fazer voar por entre os pingos de chuva, sentindo um arrepio tênue que arranhava minhas entranhas, e de dentro arrancou meu grito por você, fazendo meus sonhos pairarem no ar. Ainda pude ver seu rosto transparecer na neblina, ao longe, mas não podia correr para avisar-lhe: eu ainda espero por você.

Bruna Sommer Farias
Enviado por Bruna Sommer Farias em 30/08/2006
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