*UMA NOITE QUALQUER*

Noite memorável aquela, quando nos encontramos às portas da cidade das nuvens, enquanto éramos observados e sorríamos em nome de nosso bom entendimento. Fomos felizes e nem notamos isto, porque o tempo é inexorável. Não há um outro jeito, no entanto, de vivermos, se não sob o jugo do tempo, esgueirando-nos através dele e tentando vencê-lo, tão em vão...

Mas aquela noite ficou marcada e as fotos que tiramos estão espalhadas pelas estantes todas que guardei em minhas salas. Eu as visito, cada uma delas e, olhando para as fotos, eu me vejo tão menina e sorridente que custo a acreditar que, um dia, fomos assim tão próximos.

Como foi que nos fizemos tão distantes, afinal?

Este é mais um desses enigmas da vida: o fato de nos aproximarmos e nos distanciarmos. Enigma...vida...ela própria, todo um enigma.

Por que eu me lembrei daquela noite?

Não sei ao certo.

Talvez tenha sido o jeito de as nuvens passarem pela Lua rapidamente, do mesmo jeito que estavam naquela ocasião. Nuvens que se tornam prata e deixam de ser apenas nuvens a condensarem as gotas.

Talvez tenha sido a melodia que meu vizinho arrancou de seu saxofone, às duas da manhã, sem se importar se estava incomodando alguém.

Talvez o gosto do seu beijo em minha boca tenha voltado por acaso, um gosto de homem amado, desejado, que deseja muito a mulher que beija.

E isso me remeteu à lembrança do seu cheiro em mim. Do seu perfume de homem que quando abraça toma conta, enreda, toma posse, em silêncio.

Não sei. O certo é que aquela noite voltou inteira em minha mente. E mergulhei, desta vez sozinha, na história de nós dois.

A cidade das nuvens...nossos sorrisos e nossos gestos furtivos de carinho...principalmente naquela noite em que você, como um menino, descobriu que me amava. E nada se compara à sensação que tive de perceber o quanto isso me fazia feliz.

Ainda que não pudéssemos ser um só por muito tempo; ainda que nossa noite estivesse por acabar e que a madrugada trouxesse a realidade de nosso esconderijo; ainda que fôssemos ladrões perdidos na noite alterada, de luas tantas.

Meu homem me amava.

Era tudo de que eu precisava, então.

Naquela noite, amor de minha vida, eu fui feliz.

E, mesmo que se passem séculos e outras noites tantas, não me esquecerei do calor do meu peito ao sentir aquele amor genuíno de homem maduro que em minhas mãos fiz menino.

Naquela noite, deitei-me em seu peito e senti que ali era minha casa. Soube, também, que ninguém, jamais, poderia amá-lo tanto assim.

Uma noite qualquer...que voltou...nem sei, amor de minha vida,por quê.

Agora, que seu peito dorme quieto, tranqüilo, tão longe, tão longe da cidade das nuvens, onde vivemos nosso amor...

Aglaé Gil
Enviado por Aglaé Gil em 30/08/2006
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