A REVOLTA DA AÇÃO
Deixo o tempo passar, desconfortavelmente sentado em uma poltrona dupla, de tecido listrado, onde o verde é a cor principal. Baixa altura, sinto-me como se estivesse sentado quase no chão.
 
Olhar perdido, ao longo do largo corredor do segundo andar deste shopping. O mais famoso shopping do Rio de Janeiro.
 
Pessoas passam continuamente em todas as direções.
 
Não me recordo exatamente como cheguei até aqui. Sem carro. Sem portar documentos.. Com apenas sete reais nos bolsos.
 
Sinto-me prostrado. Falta-ma alegria. Por alguns momentos, as lagrimas umedecem minhas vistas.
 
Não sei o que fazer. Não tenho nada para fazer. Ficar ali, parado, nada resolve.
 
Fatos ocorrem, muitas vezes ao acaso. Soluções, raramente acontecem neste mesmo acaso.
 
A física afirma que é normal que tudo caminhe naturalmente para estágios de maior entropia (Tende a evoluir no sentido de aumentar a entropia). A entropia medo o grau de desordem ou de desorganização de um sistema. Assim, em um processo espontâneo, a entropia do universo sempre aumenta. Somente a aplicação ou o consumo de alguma energia, pode inverter este caminho. (Maior entropia, significa maior desordem ou desorganização. Menor entropia, indica mais ordem e mais organização.)
 
Se eu nada fizer, ou pelo menos, se nada tentar fazer, significa que o movimento natural do universo, levará o problema da miséria humana, para estágios superiores de desordem.
 
O problema, ao meu ver, é muito sério, mas ao mesmo tempo simples. Sério nos efeitos que acarreta, e simples no entendimento básico das causas. Suas causas são razoavelmente conhecidas. As soluções nem tanto.
 
Estou de luto por uma causa social. A pobreza tem levado milhões de crianças à perdição das drogas, da prostituição e dos crimes.
 
A miséria tem levado populações inteiras ao sofrimento, à doenças, à baixa estima, e a um estado de abandono tal, que a dignidade humana, vira uma brincadeira de mau gosto.
 
As causas da pobreza são em geral conhecidas: Superpopulação; baixo nível de educação, cultura e instrução; o liberalismo econômico; a ganância; a crescente e continua concentração de riquezas; entre outras. A globalização, vendida aos sete mares como uma virtude, tem levado os países mais pobres, e com menor domínio de ciência e tecnologia, a uma, cada vez maior, dependência daqueles detentores desta tecnologia.
 
Caridade é lindo. É necessário, porem nada resolve. Governantes, sabedores do estado de dependência física e psíquica destes pobres, constroem verdadeiros castelos de falácias. Fazem caridade, e não investem seriamente em infra-estrutura e educação. Nem se lembram que investir em ciência, pesquisa e desenvolvimento, gera tecnologia e retorno para o país.
 
Investir em educação pode transformar o país, pois começa a transformação pelas pessoas que constituem o país.
 
Tenho uma certeza, ficar aqui parado não resolverá NADA.
 
Levanto-me e ponho-me a caminhar sem um destino claro e objetivo. Aproximo-me de um conjunto de escadas rolantes. Devo subir, ou descer? Acabo descendo.
 
Caminho até a entrada principal. Para a direita, caminho para casa. Para a esquerda, sentido de Copacabana.
 
Ponho-me a caminhar para a praia. Alguns passos e estou em um túnel. Cruzo o túnel. Já estou em Copacabana.
 
Tenho uma enorme praia pela frente. Meu coração sofre, cada vez que percebo uma criança abandonada. Passo por várias.
 
Riqueza e pobreza, turistas e miséria, compõem a paisagem que me cerca.
 
Sinto-me impotente. Tenho mãos, braços, pernas. Tenho voz e inteligência. Talvez não tenha é coragem e vontade de agir.
 
Percebo o quanto sou fraco.
 
Decido que amanhã vou mudar.
 
O problema é que na pratica, este amanhã nunca chega. Escondo-me sob uma aura de consciência, mas na prática, nada faço.
 
Faço uma caridade aqui, um ato de fraternidade acolá. Uma ajuda ali, mas de fato, não mergulho de cabeça em ações políticas e sociais que podem realmente reconstruir este pais. Minha revolta ainda é meramente intelectual. Falta-me a revolta das ações.
 
Palavras são bonitas, são fortes, mas somente as ações, as obras e as lutas verdadeiras possuem a força da transformação.

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 13/06/2010
Reeditado em 21/06/2010
Código do texto: T2318183
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