MEU CACHORRINHO JOCA

Chegou numa tarde qualquer. Não sei hora nem dia. E ficou. Era lindo e sujo. A raça? Sei lá, uma mistura. Pequeno, cheio de carrapichos e espinhos. “Cabelos” embaraçados caindo sobre os olhos. Carinha de olhar mendigo. E eu me apaixonei. As crianças da vizinhança, vibrando. A varanda da frente virou sua casa. A cama? Um tapete de porta que ele mesmo elegeu. E o nome? Gabriela escolheu: Joca. Joca? Ué, isso não é nome de coelho? É, mas foi escolhido, ficou sendo. Joca de quê? Precisa de um sobrenome? Sobrenome da Gabriela. Então, Joca de Oliveira...

Foi assim que ele virou meu cão. Tudo meio por acaso. E que festa ele era! Banho, Joquinha? Que nada! Saía voando! Odiava água. Coisa de cachorro de rua. Mas tomava na marra! A meninada ajudando. Ele esperneava. Queria fugir. Pra que isso? devia pensar. Agora mesmo vou rolar na poeira! E ia mesmo! Sacudia-se firme, molhando todo mundo. E sumia no mundo. Ninguém tentasse impedir! Inútil! Ia pro outro lado da cidade juntar-se aos cães vadios. E era valente por lá. Logo ele que não media dois palmos de altura. Quem diria?

Mas, Joca sempre voltava. Nunca dormia fora. Vinha cheio de saudade. Pulava, gania, virava piruetas no ar. Gostava de me encantar com suas firulas. Era também o guardião do meu carro estacionado na rua. Bastava que alguém olhasse e lá vinha ele rosnando. E que rosnado! Era minha sombra, vivia me seguindo. Caminhava comigo, de manhãzinha. Longos seis quilômetros, mas ele nem ligava. Corria na frente. Escondia-se na vegetação. Ficava quieto. Quando me via, pulava na frente. Feito criança travessa assustando um adulto.

Joca nunca se deixou domar. Tinha seu lado vagabundo. Mas era doce e fiel. No inverno de 2003, adoeceu. Amanheceu triste no tapete. Recusou a comida. Não quis rua, nem caminhar. Percebi a espuma no canto da boca, os olhos embotados. Um veterinário da cidade vizinha veio buscá-lo. Joca olhou-me triste e partiu. Sem muitas esperanças, eu sabia... Mas, no fim da tarde a ligação “O danadinho é duro na queda! Em três dias vai ficar bom!”. Ah, que alegria! Joca era forte. Reagiu de forma inesperada!

Três dias. Meu cãozinho devia voltar pra casa logo pela manhã. Mas ele não veio. Nunca mais voltou. Durante a noite soltou-se e fugiu. O corpo foi encontrado ao amanhecer, sobre uma ponte. Tinha percorrido metade da distância entre as duas cidades quando foi atropelado. Àquela hora, louco de saudade, Joca de Oliveira voltava pra casa...